Acho que 2021 conseguiu me quebrar.

Isso não é um “privilégio” único para mim, considerando as circunstâncias odiosas em que o planeta Terra se encontra, e certamente muitos sofreram perdas muito maiores do que eu. Mas é difícil ter um ano muito bom quando seu cachorro morre em 2 de janeiro.

Não foi de todo ruim (especialmente na parte da vida amorosa), mas esse ano vai ficar na memória mais pelo que não consegui fazer, melhorar ou completar durante os últimos meses.

E, ao meu ver, isso se reflete nos jogos que joguei este ano, no sentido em que gostaria de ter jogado mais.

De certa forma, vejo essa lista como incompleta, já que há tantos games interessantes que não tive a oportunidade de jogar, ou de não jogar muito. Títulos como Psychonauts 2, Metroid Dread, Sable, Unsighted, que me prenderam por breves momentos antes de deixá-los de lado por alguma responsabilidade ou outra.

E admito que a natureza nojenta e brutal dessa indústria não ajudou com meu humor — não porque já não soubesse que o mundo dos games é construído no sofrimento e exploração de trabalhadores, mas por ver o quanto essa cultura atravessa fronteiras, e como mesmo sob os holofotes, os culpados raramente pagam pelo que já fizeram.

Ao menos dessa vez algo parece estar mudando, considerando as revoltas dentro da Activision Blizzard e Ubisoft.

Enfim, desculpas à parte, mesmo não tendo tempo para jogar a maior parte das coisas que gostaria, essa lista reflete o que considero que surgiu de melhor neste ano, e que me marcou e tocou de diferentes formas.

Por um 2022 menos desastroso.

Resident Evil Village

Resident Evil Village

Resident Evil Village não é meu jogo favorito da série, mas reúne muitos dos meus elementos favoritos em um único pacote, destilando o que há de melhor em games como RE4 e RE7 e aplicando a fórmula em um novo contexto.

O combate é envolvente e satisfatório, mas (quase) sempre trazendo um elemento de tensão, encontrando um excelente equilíbrio entre ação e horror que não via desde… bom, o remake de Resident Evil 2.

Não só isso, o jogo conta com alguns dos momentos mais inventivos e perturbadores que já vi na franquia (quem foi à Casa Beneviento sabe do que estou falando)

Tenho várias ressalvas quanto ao jogo, incluindo boa parte de sua narrativa e algumas ideias estranhas, como o momento em que o jogo torna-se brevemente um Call of Duty com lobisomens, mas RE Village traz uma conclusão que coloca a direção da série em um ponto curioso.

Capcom/Divulgação

It Takes Two

It Takes Two

It Takes Two não é necessariamente meu jogo favorito de 2021, mas é bem possivelmente o mais audacioso e mais impressionante projeto do ano.

O mero fato de que o jogo, que não só usa de várias mecânicas e tipos de gameplay diferentes, mudando radicalmente de estilo em questão de minutos, simplesmente funciona já é digno de respeito. Que essencialmente todas essas variações sejam engajantes e divertidas, e funcionem com o aspecto de solução de quebra-cabeças em dupla, o coloca em outro patamar.

Tenho problemas com a narrativa, e sinto ser um pouco longo demais, mas é inegável que Josef Fares e sua equipe na Hazelight fizeram algo especial, quase uma evolução do que se via de estúdios como a Rare nos anos 1990.

E, se quiser uma recomendação em particular, tente jogar com alguém especial. Como a Isa disse na lista dela, jogar com quem você tem intimidade e ao menos entendam as vibes um do outro é algo único.

Hazelight/Divulgação

Before Your Eyes

Before Your Eyes

Um soco na minha alma.

A proposta de Before Your Eyes é inventiva o suficiente por si só, com o “controle” sendo o piscar de olhos do jogador, capturado via uma webcam, além de um mouse para movimentar seu olhar.

Mas o que torna o jogo ainda mais especial é como essa ferramenta é utilizada para contar a história de uma vida, em que uma memória tende a durar apenas até o ponto em que você (voluntariamente ou não) pisca os olhos, sendo lançado imediatamente para outra cena.

É uma mecânica que comunica perfeitamente a ideia do apego às nossas memórias e, ao mesmo tempo, de como esses momentos podem ser efêmeros, podendo desaparecer em um instante.

(Você pode não usar uma webcam e apenas clicar no mouse quando seguir em frente, mas o impacto da experiência se perde)

Enquanto jogava, não pude deixar de traçar um paralelo com outro grande jogo indie de 2021, Unpacking. Naquele game, você descobre mais sobre a identidade de uma pessoa em momentos específicos de mudança (literal e metafórico), presenciando sua evolução por meio do ambiente e seus objetos.

Porém, em Unpacking esses momentos estão “congelados”, e é possível explorar os ambientes pelo tempo que quiser. Aqui, você tende a vê-los apenas até o instante em que seus olhos piscam.

Before Your Eyes traz uma narrativa relativamente simples, sobre encontrar o significado e valor em uma vida, que é potencializada ao ser contada de uma forma única e diferente.

E, muito provavelmente, vai te deixar acabado em lágrimas ao final.

Skybound Games/Divulgação

Deathloop

Deathloop

É bem possível que nunca mais jogue Deathloop de novo, tendo ficado imerso no jogo por dias e horas a fio para completar seu review a tempo (e ainda acabei me atrasando um pouco para isso).

E quer saber? Por mim tudo bem, já que explorar Blackreef e descobrir seus vários segredos, as formas de lidar com seus inimigos, e como resolver o quebra-cabeças da morte dos Visionários foi uma das minhas experiências favoritas em 2021, e o fato de isso não poder ser facilmente replicada só a torna mais especial.

(O que é meio paradoxal por ser um jogo de loop temporal, certo?)

Como falei na época é o meu jogo favorito da Arkane, mas é o que mais recomendaria para as pessoas, especialmente quem não tem tanto contato com o conceito do Immersive Sim, para dar uma ideia melhor do que ele se trata.

Arkane Lyon/Divulgação

Inscryption

Inscryption

Por meses, eu tenho tentado encontrar as palavras para explicar Inscryption, mas é extremamente difícil sem contar muito das suas surpresas e reviravoltas.

Seria possível simplificar ao dizer que é um card game com uma temática de horror e elementos de roguelike, mas ao mesmo tempo talvez seja simplificar demais o que há nesse pacote em particular.

Eu já tinha ouvido falar de Daniel Mullins e um de seus jogos anteriores, Pony Island, por isso tinha uma leve noção de que as coisas poderiam ficar subitamente… estranhas, mas ainda assim, não estava preparado para as viradas malucas que Inscryption proporciona.

Durante a sua duração, há mudanças significativas de perspectiva, estilos de gameplay, estética e regras, mas ainda conseguindo se manter como um card game curioso e cheio de estratégias diferentes.

Tudo isso junto casado com uma narrativa que mistura o gênero found footage, YouTube e FMVs com atores reais, e um dos finais mais fascinantes e insanos dos últimos tempos.

Falo isso como alguém que não curte card games: Inscryption é meu jogo favorito de 2021, e você deveria ao menos ver qual é a dele.

Só tome cuidado para não cavar em buracos errados.

Devolver Digital/Divulgação

Menção honrosa: Road 96

Road 96

Falando em jogos que gostaria de ter abordado mais em texto, Road 96 é um game que não entra no meu Top 5 em geral, mas que me surpreendeu com um dos momentos mais chocantes que joguei em 2021.

Road 96 é um jogo da DigixArt, formado por antigos desenvolvedores da Ubisoft Montpellier, de Rayman e, mais relevante, Valiant Hearts: The Great War.

Nele, você controla uma série de adolescentes que devem cruzar a fronteira de um país em colapso, encontrando vários personagens curiosos e fazendo decisões que mudam os rumos de suas vidas.

(Spoilers leves abaixo)

Nas minhas primeiras sessões, os jovens que controlei ou conseguiram passar pela fronteira, ou foram capturados e mandados para prisão. Pelo menos, até a conclusão narrativa de uma dos personagens, que precisava fugir do país com informações sensíveis.

Os soldados da fronteira foram alertados, e corremos para o portão se fechando, com a personagem que acompanhava caindo no chão e prestes a ser capturada pelos guardas. Um prompt trouxe as escolhas de fugir ou ajudar a outra pessoa, e escolhi a segunda opção sem pensar duas vezes.

Ao salvar essa pessoa, minha personagem — uma menina adolescente — foi brutalmente metralhada pelos guardas, morrendo a poucos passos de escapar.

… Eu não tinha ideia de que isso poderia acontecer, e poucas vezes senti uma porrada tão forte quanto naquele momento.

Road 96 conta com vários momentos que considero forçados ou caricatos, mas só por me proporcionar esse momento em particular, acredito que merece um lugar nesta lista.

DigixArt/Divulgação