Onde você estava em 1996? Quieto no quarto, jogando? Refletindo sobre qual seria o melhor console a se adquirir em uma era cheia de opções? Aprendendo a falar e andar? Pensando sobre onde e quando gostaria de nascer? Seja a resposta qual for, esse ano entrou para a história como um dos mais ricos períodos do primeiro PlayStation, com o nascimento de séries como Resident Evil e, obviamente, Crash Bandicoot.

Sim! Foi em 1996 que a Naughty Dog, aquela de The Last of Us e Uncharted, lançou o primeiro jogo do personagem que se tornaria uma espécie de mascote da PlayStation. Na época, duas das então principais desenvolvedoras de consoles já tinham os próprios personagens icônicos: a Nintendo, com Mario, e a SEGA, com Sonic. A Sony demorou dois anos para ter um bichinho carismático para chamar de seu.

Crash Bandicoot (1996)

Crash dançando.

A estreia de Crash Bandicoot no PlayStation foi bastante respeitável. Na edição Gamers do Guinness World Records de 2015, consta que o primeiro jogo do Crash vendeu 6.820 milhões de cópias somente naquele console. Nem estamos somando as cópias piratas, que existiam aos montes por cinco reais na época do PlayStation 1.

Lançado no mesmo ano que Super Mario 64, Crash Bandicoot chamou a atenção pelo visual, pela dificuldade e pelo próprio personagem, que cativou audiências mundialmente — chegando a fazer sucesso até mesmo no Japão, algo relativamente raro quando falamos em títulos ocidentais da década de 1990.

Crash fase do castelo.

Contudo, você já deve imaginar que inovação não era bem o forte do novato Crash. Enquanto o título mais recente do Mario estava revolucionando completamente o gênero plataforma e apresentando ideias que se tornariam regra na indústria, Crash ainda jogava na zona de conforto, trazendo um mapa linear com 32 cenários em que simplesmente andávamos em direção ao fundo da tela pulando obstáculos ou indo da esquerda para a direita — pulando obstáculos também.

No primeiro Crash, a história também era bem simples, algo esperado em jogos de plataforma lançados naquela época. Ele havia sido criado pelo maligno Doutor Neo Cortex e precisava salvar a namorada dele, a também marsupial Tawna, que havia sido sequestrada. Nada demais.

Wumpa em Crash.

Definitivamente aprovado por público e crítica, era questão de tempo até que Crash Bandicoot retornasse. Inclusive, quando ele voltou, jogadores do mundo inteiro conheceram aquele que se tornaria o jogo mais vendido da franquia no primeiro PlayStation: estamos falando, é claro, de Crash Bandicoot 2: Cortex Strikes Back.

Crash Bandicoot 2: Cortex Strikes Back (1997)

Fase do gelo em Crash 2.

Todos os aspectos de Crash foram melhorados no segundo jogo da série. A quantidade de fases obrigatórias para zerar o game foi diminuída para 25, mas o visual e os controles se tornaram muito mais interessante do que os do primeiro jogo. Além disso, a adição de uma sala secreta com mais fases e dois cenários escondidos contribuíram para que aquele saudoso papo de conspiração rolasse entre os jogadores. Será que tem mesmo aquela fase que só o loroteiro viu? Nesse caso, tinha mesmo.

Foi no segundo jogo do Crash que jogadores conheceram a irmã mais nova dele, Coco, que se tornaria uma personagem presente em todos os próximos títulos da franquia. Com o elenco um pouco maior e mais cutscenes entre as fases, uma lógica narrativa coesa começou a surgir de maneira mais explícita e divertida. Crash ganhava novos traços de personalidade e tinha com quem contracenar, digamos assim.

Lago em Crash Bandicoot.

Aliás, esse jogo tinha um dos segredos mais cruéis de todos os tempos. Chegando ao segundo andar da torre que Crash precisa escalar para encontrar os portais de cada fase, os jogadores encontram polar, aquele pequeno ursinho branco dos jogos de corrida. Pulando na cabeça do Polar dez vezes ou simplesmente batendo nele dez vezes, Crash ganhava dez vidas — algo importante quando falamos em um jogo desafiador. Agora, vale a pena? Me diga você.

Alcançando ainda mais jogadores do que o primeiro, Crash 2 vendeu impressionantes 7.58 milhões de cópias, sendo o quinto jogo mais vendido na história do PS1 de acordo com o Guiness. Ele fica à frente do primeiro jogo, que ocupa a oitava posição, e também da sequência, Crash Bandicoot 3: Warped, que ficou em sétimo lugar, com 7.13 milhões de cópias vendidas.

Crash 2 final.

Consta, no Guiness de 2015, que Crash Bandicoot foi a única franquia a contar com três jogos no top 10 dos jogos mais vendidos de todos os tempos no PlayStation original. Outras séries também fizeram muito sucesso, evidentemente, como Final Fantasy (com dois jogos no Top 10) e Gran Turismo (também com 2 jogos no Top 10). Agora, três jogos? Só o Crash conseguiu.

Existem estimativas que colocam Tekken 3 e o primeiro jogo do Harry Potter acima dos jogos do Crash em termos de vendas. Contudo, os números foram citados no GameSpot e na GameInformer, respectivamente, sem quaisquer fontes. Também não há como saber se foram contabilizadas, portanto, cópias vendidas em outras plataformas além do primeiro PlayStation. Aqui, vamos seguir com os números do Guiness.

Crash Bandicoot 3: Warped (1998)

Moto de Crash 3.

Você pode estar um pouco chocado com o fato de que Crash 3 vendeu menos do que Crash 2. Eu, pelo menos, não esperava isso de forma alguma, já que todos na minha bolha da infância jogavam apenas Crash 3. De qualquer forma, dados são dados.

Crash 3 se passava após o final do segundo jogo e trazia um conceito curioso: Crash, Coco e o sempre presente Aku Aku, aquela máscara que serve, basicamente, como guia espiritual e figura paterna dos dois marsupiais, precisam viajar pelo tempo em diferentes eras para impedir que Neo Cortex e N. Tropy escravizem a humanidade.

Coco em Crash 4.

Foi nesse jogo, inclusive, que os vilões acabaram libertando uma entidade maligna conhecida como Uka Uka, o irmão gêmeo de Aku Aku.

De todos os jogos do Crash que aparecem no Metacritic, o terceiro possui a maior nota média entre os críticos, com impressionantes 91 pontos. Para você ter ideia, isso é mais do que Crash 4 e a trilogia remasterizada dos jogos originais. De qualquer forma, sabemos que notas não são tudo.

O ponto é que Crash 3 realmente tinha algo de especial. Todas as fases eram absolutamente lindas para o padrão de qualidade do PlayStation, os mundos eram extremamente variados de acordo com cada período histórico, as animações de morte do Crash (um ponto clássico da franquia) estavam ainda mais criativas. Era maravilhoso.

Javali em Crash 4.

Inclusive, Coco se tornou jogável pela primeira vez em Crash 3, naquelas fases famosas com Pura, o tigre de estimação da irmão do Crash, e a fase do jet ski.

Quando pensamos na origem de Crash, a trilogia do primeiro PlayStation era algo absolutamente fenomenal. Todos os jogos entraram no top 10 da plataforma, foram muito elogiados pela crítica e apresentavam gráficos sensacionais. Todos os donos de PlayStation 1 que conheci jogaram pelo menos um dos três games — e não é difícil entender o motivo do sucesso.

Entretanto, o período de alegria da série nas mãos da Naughty Dog estava prestes a acabar. Ainda bem que, antes do declínio absoluto, veio ao menos mais um grande sucesso.

Crash Team Racing (1999)

Crash Neo Cortex.

Acredite se quiser, mas jogos de Crash foram lançados anualmente entre 1996 e 2008. Foi mais de uma década com novos jogos sendo lançados frequentemente. É uma pena que nem metade deles tenha feito tanto sucesso.

Bom, vamos deixar a parte ruim para depois. Afinal, em 1999, Crash Team Racing, o primeiro jogo de corrida do Crash — ou Crash de corrida, como as pessoas dizem — foi lançado.

Fase do gelo em Crash corrida.

No maior estilo Crash, a história do jogo começa assim: o alienígena Nitros Oxide desafia os habitantas da Terra para uma corrida. Se ele vencer, a Terra será transformada em um grande estacionamento. Se os humanos vencerem, ele vai embora. Por incrível que pareça, os objetivos de Crash e Neo Cortex estão alinhados pela primeira vez. Então, eles decidem enfrentar o invasor.

Ao todo, o jogo contava com quinze personagens jogáveis. No maior estilo Mario Kart, os personagens podiam pegar boosts de velocidade em certos pontos das pistas e usar especiais para ferrar os amiguinhos. Existia também o sistema de pegar turbo após derrapar por um tempo específico, sendo esse o principal diferencial do game na época, além da turma de personagens característica.

Crash corrida Coco.

Existia um modo de aventura, no qual acompanhávamos a história do jogo, provas de tempo, corridas divididas em copas, versus local, batalha entre dois jogadores. De forma geral, era um jogo de kart comum, mas temático de Crash Bandicoot. Para jogadores de PlayStation que queriam ter algum jogo de kart, era uma opção absolutamente válida.

Crash Team Racing vendeu um pouco mais de 2 milhões de unidades somando Estados Unidos e Japão. Mesmo que não tenha alcançado o sucesso dos títulos que vieram antes, o game acabou deixando uma marca e mais títulos de corrida do marsupial viriam no futuro.

Uma pena que, muito antes disso, a franquia entraria em declínio.

Crash Bash (2000)

O último jogo do Crash exclusivo para PlayStation foi lançado no ano 2000. Crash Bash era um party game com 28 minigames. Na história do jogo, Aku Aku e Uka Uka começaram uma competição do bem contra o mal no qual os personagens de Crash competiriam uns contra os outros (heróis sob a proteção de Aku Aku e vilões sob a proteção de Uka Uka).

Ao contrário da primeira trilogia, esse Crash já não era desenvolvido pela Naughty Dog, cujo contrato original era para apenas três jogos. O único motivo de Crash Team Racing ter sido lançado pela Naughty Dog foi o fato de que o desenvolvimento ocorreu paralelamente a Crash 3. Como muitas horas de trabalho já tinham sido investidas no jogo de corrida, a Naughty Dog decidiu que ia lançar.

Crash na cidade.

Quando chegou, Crash Bash se tornou o jogo da franquia menos elogiado pela crítica até então. Surpreendentemente, de acordo com dados do The Magic Box, o título superou um milhão de cópias vendidas nos Estados Unidos. Na Europa, a Associação de Publicadores de Programas de Diversão e Entretenimento listou Crash Bash como um título platinum, o que significa que o jogo bateu pelo menos 300 mil unidades. De qualquer forma, estamos falando de muito menos do que os jogos anteriores.

Apesar do aspecto multiplayer ter sido bastante elogiado no período, críticas ao tamanho dos personagens na tela e à falta de inovação eram constantes — além de justificáveis, né, porque convenhamos: foi o segundo formato tradicional da Nintendo a ser copiado na série.

Crash Bandicoot se torna universal

Foi em 2001 que a relevância de Crash Bandicoot passou a ser questionável. O lançamento de The Wrath of Cortex, primeiro jogo da série principal a ser lançado desde 1998, era fundamental para garantir o retorno de Crash à plena forma. O jogo chegou primeiro ao PS2 e, posteriormente, aos consoles concorrentes: Xbox e GameCube.

Mesmo sendo lançado em todas essas plataformas, Crash: Wrath of Cortex não chegou a bater metade das vendas do primeiro jogo no PlayStation original. Além disso, a crítica voltou a reclamar da falta de inovação, alegando que o jogo continuava reproduzindo as mesmas ideias de três anos atrás.

Crash morrendo

Pelo menos Wrath of Cortex marcou o nascimento de Crunch Bandicoot, um marsupial bombado que viria a aparecer nos jogos de corrida e até se tornou relativamente respeitado entre os fãs. Sendo bem honesto, eu gostaria de ter visto Crunch em Crash 4.

Se, por um lado, o começo de Crash como um jogo multiplataforma nos consoles de mesa foi bem morno, a franquia parecia promissora no Game Boy Advance. Afinal, Crash Bandicoot: The Huge Adventure, lançado em 2002, impressionava com visual acima da média para a plataforma e fases inteligentes, apesar da já citada falta de inovação.

Ávidas por fazer Crash bombar de novo, Vicarious Visions e Universal Interactive, empresas responsáveis pela franquia nos anos 2000, lançaram dois jogos em 2003.

Tubo de água em Crash Team Racing.

Crash Bandicoot 2: N-Tranced, a já esperada sequência do primeiro Crash lançado para Game Boy Advance, que havia se mostrado um sucesso, foi lançado em janeiro de 2003 nos Estados Unidos. Em novembro daquele ano, Crash Nitro Kart, o segundo jogo de corrida do nosso querido mascote, foi lançado para PlayStation 2, Xbox, GameCube e Game Boy Advance.

Novamente, a crítica elogiou o jogo de Game Boy muito mais do que o game lançado para os consoles de mesa. Parecia que esse seria o novo padrão de Crash: o de uma série mediana com alguns sucessos nas plataformas portáteis. Não à toa, os lançamentos de 2004 seguiram exatamente a mesma lógica... Pela última vez.

O começo do (quase) fim

Seguindo o padrão de Pokémon, que sempre lançava dois jogos por vez, Crash Bandicoot Purple: Ripto's Rampage e Spyro Orange: The Cortex Conspiracy foram lançados para Game Boy Advance. Como você já deve imaginar, o jogo colocava dois dos mascotes da Sony lado a lado: Crash e Spyro. Nos jogos, era necessário vencer em uma série de minigames para salvar o mundo dos terríveis Neo Cortex e Ripto.

Não funcionou. Apesar dos elogios a alguns minigames individuais, a obra completa parecia um tanto desconexa e desagradou grande parte dos fãs. Nos consoles de mesa, a situação não era muito melhor. Crash Twinsanity, lançado também em 2004 para PS2 e Xbox, até tentou inovar, oferecendo a possibilidade do jogador explorar o mapa com liberdade. Contudo, esse conceito já não era tão inovador — e as fases não surpreenderam também.

Crash Team Racing largada.

Após uma não tão bem sucedida dobradinha, que marcou o último jogo da série desenvolvido pela Vicarious Visions (aquele crossover com Spyro), Crash voltou a ser um título anual com apenas um lançamento por ano.

Em 2005, Crash Tag Team Racing foi lançado para GameCube, PlayStation 2, Xbox, e PSP. O jogo foi desenvolvido pela Radical Entertainment e distribuído pela Vivendi Universal Games. Esse foi o terceiro jogo de corrida do Crash, mas acabou alcançando menos sucesso do que os outros dois tanto em crítica quanto em público.

Deixando de lado os jogos de aventura e corrida dos anos anteriores, o party game Crash Boom Bang!, de Nintendo DS, foi o único lançado em 2006. Esse jogo entrou para a história como o mais mal avaliado de toda a franquia. Com a decadência gradual perceptível nos últimos anos, era questão de tempo até que um fracasso completo chegasse. E chegou.

No ano seguinte, em 2007, Crash of the Titans foi lançado e até agradou parte da crítica. Apesar de reclamações sobre os controles, que não eram muito precisos, a variedade de gameplay e visual chamaram a atenção dos críticos. As informações de vendas de muitos desses títulos da era PS2 não são fáceis de encontrar, mas parece que o público também gostou do game. Afinal, uma sequência intitulada Mind Over Mutant foi lançada em 2008.

Coco em bichinho.

A recepção foi um pouco pior em relação ao título anterior. No entanto, isso está longe de ser um fracasso completo. Acredite se quiser: 2008 ficou marcado como o melhor ano de Crash na era da Radical Entertainment, que trabalhava no jogo desde 2005 e fez uma revolução tanto visual quanto conceitual na série.

Nos celulares, o jogo Crash Bandicoot Nitro Kart 3D , desenvolvido pelo estúdio sueco Polarbit, surpreendeu a todos e alcançou avaliações boas em diferentes veículos. Infelizmente, entretanto, já era tarde demais. Os anos 2000 se mostraram muito complicados para o nosso querido marsupial, que logo entraria em hiato.

Crash Bandicoot Nitro Kart 2, a sequência de Crash Bandicoot Nitro Kart 3D, foi lançada em 2010 para iOS, dois anos após o antecessor. Esse foi o último jogo do Crash a ser lançado até 2017, quando a trilogia remasterizada nasceu.

Ressurreição

Crash Neo Cortex.

A clássica trilogia do primeiro PlayStation foi remasterizada em 2017. Eram os três jogos mais importantes na história da franquia completamente renovados visualmente. Aqueles mesmos títulos que muito contribuíram para o sucesso do próprio PlayStation.

Crash Bandicoot N. Sane Trilogy, lançado pela Activision, que pagou mais de 8 bilhões de dólares à Vivendi Universal para se tornar independente, foi avaliado pelo The Enemy em 2017 como uma coletânea que trazia de volta tudo o que existia de melhor e pior na série ao mesmo tempo. Visualmente, o jogo impressionava, mas alguns ajustes nos controles cairiam muito bem.

N Tropy em Crash.

Para a surpresa de muitos jogadores, a trilogia remasterizada de Crash Bandicoot superou 10 milhões de cópias vendidas, mais do que qualquer outro game da série.

O feliz retorno de Crash contou ainda com uma elogiada remasterização/coletânea dos três primeiros jogos de corrida da série. Crash Team Racing Nitro-Fueled chegou em 2019 e alcançou boas avaliações em todas as plataformas mundialmente.

No ano seguinte, em 2020, Crash Bandicoot: It's About Time, o primeiro jogo inédito do Crash desde 2010, foi lançado. A história é uma sequência direta de Crash 3, do PlayStation 1. Apesar de não considerar canônicos os acontecimentos dos jogos de PS2, Crash 4 dá a entender que Crash e Coco morreram na linha do tempo dos jogos mais criticados da franquia.

Coco e Crash.

Aliás, você pode não ter percebido, mas jogos de Crash vêm sendo lançados anualmente desde 2019. Afinal, em 2021, houve também o lançamento de Crash Bandicoot: On The Run, baixado mais de 10 milhões de vezes na Google Play Store.

É verdade que a história de Crash foi cheia de altos e baixos. Desde o surgimento da franquia, que completou 25 anos em 2021, foram mais períodos de decepção do que períodos de felicidade. De qualquer forma, é fato que o lançamento de um Crash inédito e o retorno dos jogos mais amados da série deixaram muitos dos fãs extremamente felizes.

Capa de Crash 4.

O futuro parece promissor e os últimos anos foram gentis com os fãs de Crash. Se você é um deles, parabéns! Acho que estamos num bom caminho.