Bons vilões raramente se encaixam no que podemos chamar de "vilão". Um adversário com motivações justas e intenções realmente boas é apenas isso: um oponente. No mundo de The Last of Us, da Naughty Dog, isso fica bastante evidente quando conhecemos perspectivas diferentes sobre o mesmo acontecimento.

Apesar do título presunçoso deste artigo, o relato a seguir é bastante pessoal. Você talvez já tenha passado por algo semelhante jogando outros games, então, sinta-se à vontade para comentar sobre jogos que lhe passaram um sentimento similar ao que será apresentado a partir de agora.

Joel e Ellie no primeiro The Last of Us.
Naughty Dog.

Desde o instante em que conhecemos Ellie, no primeiro The Last of Us, a tendência da maior parte dos jogadores é sentir um apego imensurável à personagem. O jogo não esconde, nem por um segundo sequer, que ela servirá como uma "segunda filha" para Joel.

Ver o amadurecimento de Ellie ao longo do primeiro The Last of Us e, finalmente, chegar à versão dela que conhecemos em The Last of Us Part II é uma jornada marcante pelos mais variados motivos. Por isso mesmo, quando nos aproximamos do final do segundo jogo, existe um objetivo específico que pode deixar muitos jogadores apreensivos.

Ellie com raiva.
Naughty Dog.

No controle de Abby, que já havia torturado e matado Joel, o jogador se vê obrigado a perseguir — e, supostamente, matar — Ellie. Não que Ellie seja moralmente infalível, considerando tudo o que ela fez antes dessa cena. Mas, por conhecermos tão profundamente a perspectiva da personagem, é difícil realmente querer ganhar a batalha contra ela.

Talvez outras pessoas tenham conseguido seguir em frente com essa missão sem problema algum. Contudo, confesso que perdi propositalmente mais de uma vez na tentativa de criar uma rota alternativa para a história. Matar Ellie no controle de Abby era algo que eu simplesmente não queria fazer. Mesmo que, lá no fundo, eu soubesse que Ellie dificilmente morreria.

Abby e Ellie.
Naughty Dog.

Muito antes disso, matar todos os amigos da Abby não era algo que parecia justo também. As mortes de alguns deles vieram acompanhadas de um sentimento de culpa genuíno. Mesmo assim, quando chegou a hora de lutar contra Ellie, qualquer resquício de disposição simplesmente desapareceu.

Como se esse impasse não fosse o suficiente, a partir do momento no qual Abby deixa que Ellie viva, é difícil não se sentir aliviado e até mais apegado à Abby do que antes. Passam-se mais algumas horas, entretanto... E lá vamos nós, no controle de Ellie, lutar contra uma versão totalmente destruída de Abby. Motivados apenas por vingança (mais uma vez) e orgulho ferido.

Ellie sem dois dedos.
Naughty Dog.

Quando encontramos Abby a um passo da morte, basicamente, o mesmo sentimento de não querer ganhar pode tomar o coração dos jogadores. Ela está ali. Ellie tem a chance de derrotá-la desta vez. Mas Abby mal tem como se defender. Como você vai se orgulhar de matar alguém naquele estado? E até que ponto a violência de Ellie ainda era justificável?

Antes do lançamento de The Last of Us Part II, eu nunca havia sentido tanta vontade de perder em diferentes momentos de um jogo. Esse foi o único game que me fez sentir raiva de ganhar e, depois, mostrou que valia a pena chegar até o final; valia a pena passar por tudo aquilo.

Não sei se algum dia terei coragem de jogar The Last of Us Part II inteiro de novo, porque a experiência não terá o mesmo impacto. Ainda assim, sempre que me lembro desse game, os sentimentos que vêm junto são extremamente fortes — e majoritariamente positivos, sem dúvida alguma.