Com sua população superior a 1,3 bilhão de pessoas, a China tem um mercado doméstico grande o suficiente para criar empresas gigantescas sem que elas tenham sequer oferecido produtos fora de suas fronteiras.

Por conta disso, parece um fenômeno bastante comum para consumidores ocidentais ouvir pela primeira vez o nome de uma companhia chinesa sem se dar conta que elas já são enormes dentro de casa.

Nos últimos meses, um dos casos mais latentes deste fenômeno parece ser a Tencent, um conglomerado de mídia e telecom que ainda pode ser um mistério para alguns consumidores do lado de cá do globo, mas que já é uma das maiores companhias do mundo – tendo até ultrapassado o valor de mercado do Facebook  em novembro do ano passado, quando foi avaliada em US$ 528 bilhões. Atualmente, a companhia é avaliada  em US$ 560, ficando atrás apenas da Apple, Alphabet (Google), Amazon e Microsoft.

Particularmente para gamers, o crescimento da Tencent parece ainda mais relevante. Nos últimos anos, as movimentações da empresa no setor incluíram a aquisição da maior parte das ações da Riot Games, desenvolvedora de League of Legends, a compra de 40% da Epic Games, responsável pelo sucesso Fortnite, e da Supercell, de Clash Royale. Na última terça-feira (20), a empresa colocou também no bolso parte da Ubisoft, resultado da venda da participação da Vivendi na desenvolvedora.

Mas para entender o crescimento Tencent e de sua atual relevância no mercado global  de Internet e tecnologia, é preciso antes sair um pouco de setor de games e voltar a atenção para aplicativos móveis – em especial, o WeChat.

Apesar de ter sido fundada em 1998 e de operar diferentes produtos durante os anos, foi o lançamento do WeChat, em 2011, que catapultou a Tencent para sua sua posição atual.

Reproduçõa/Tencent

Primariamente um aplicativo de mensagens aos moldes de WhatsApp e Facebook Messenger, o WeChat cresceu muito além de suas contrapartidas ocidentais e criou um ecossistema assustador de serviços na China – agregando, por exemplo, recursos de pagamento mobile, de rede social, feed de notícias e até serviços especializados, como marcar uma consulta médica ou tirar um visto para Hong Kong and Macau.

Por conta da característica majoritariamente móvel do mercado chinês, onde muita gente saltou de não ter internet diretamente para a internet móvel, o WeChat conseguiu se consolidar como a principal plataforma através da qual chineses usam a web, o que trouxe uma boa parte de transações financeiras para o ambiente da Tencent.

Aliando isso ao bloqueio do governo chinês para a entrada de concorrentes estrangeiros no país, o WeChat logo decolou – ultrapassando a marca de 1 bilhão de usuários após este ano novo chinês, segundo os resultados financeiros mais recentes da empresa.

O sucesso do serviço foi a grande alavanca do crescimento da empresa, que ainda soube aproveitar o boom do setor de internet apoiado pelo governo chinês para ganhar mais musculatura. A partir daí, foi só a empresa diversificar ainda mais seus investimentos – que já incluem a assistente pessoal Xiaowei, nos moldes da Alexa ou Google Assistente – e partir para negócios no exterior.

E é aí que nós voltamos aos games. Além dos exemplos já citados lá em cima, a companhia continua investindo de forma bastante diversa no setor, com apostas que vão do gênero de simulação espacial – com a compra de 9% da Fontier Developments, de Elite: Dangerous, no ano passado – ao popular gênero Battle Royale – com o acordo para a adaptação e publicação de PlayerUnknown's Battlegrounds na China. Até a Activision-Blizzard, de franquias com o Call of Duty, Overwatch e World of Warcraft, também tem um dedinho investidor da Tencent.

Divulgação/Riot Games

Todos os negócios da empresa reunidos garantiram a Ma Huateng, CEO da Tencent, o posto de a pessoa mais rica do país em março deste ano, com uma fortuna que atinge hoje os US$ 47 bilhões. Só em 2017, a empresa viu um aumento de receitas total de 51% em relação ao ano anterior, chegando aos US$ 10,1 bilhões – atribuído, em grande parte, às receitas de games online como o mobile Honour of Kings, League of Legends e Dungeon Fighter Online.

A pergunta que fica agora, no entanto, é como a Tencent planeja continuar sua expansão. Dentro da China, a empresa concorre com as outras duas gigantes de tecnologia Baidu e Alibaba, e mirar agora no setor tradicional de varejo físico para expandir suas finanças, utilizando suas tecnologias para apoiar parceiros na conversão de clientes.

Segundo a Forbes, a empresa anunciou um investimento de US$ 5,4 bilhões em uma das maiores empresas de shoppings da China, em um movimento que colocará a companhia em uma competição mais acirrada contra a Alibaba.

No ocidente, no entanto, a expectativa é que a empresa enfrente problemas para continuar expandindo seus negócios de forma direta –  aos moldes dos problemas de desconfiança enfrentados pela chinesa Huawei nos Estados Unidos –, mas ambição e o capital da empresa através de investimentos não dão sinais de desacelerar tão cedo, o que sugere que seu nome deverá ficar cada vez mais familiar para consumidores deste lado do globo.