Há exatos 25 anos, em 3 de dezembro de 1994, a Sony lançava no Japão o PlayStation original, o primeiro console de videogame da história da gigante japonesa do setor de eletrônicos e entretenimento.

Adotando CD-ROM como padrão para seus jogos e se apresentando como alternativa mais amistosa para desenvolvedores de games, o console foi o primeiro passo que levou a companhia a trilhar um caminho de sucesso no mercado dos games, tornando-a parte integral da indústria – e, para muitos, sinônimo de jogos eletrônicos ao lado de nomes como Nintendo, Sega e Atari.

O caminho até lá, no entanto, foi longo. Para quem, há um quarto de século, acompanhava ao vivo o lançamento do primeiro console da Sony, prever que o recém-nascido PlayStation teria um futuro brilhante não era a conclusão mais óbvia – nem a mais fácil.

Isso porque, para o público geral, o lançamento de um console pela Sony, por si só, era uma surpresa. Famosa por seus walkmans e outros eletrônicos, a Sony era uma marca bastante conhecida por consumidores, mas sem tradição alguma no mercado de games. E, além de novata, a companhia ainda enfrentaria pelo seu caminho adversários carrancudos como a Sega, com o Saturn, e a Nintendo, com o Nintendo 64. Como diabos essa idea daria certo?

Pois bem, ela deu. E, em grande parte e ironicamente, foi por conta de dois empurrões importantes das próprias rivais: Nintendo e Sega.

Cedric Biscay/Reprodução

O início

Apesar de um tanto complexa e cheia de detalhes interessantes, a história do PlayStation original pode, de certa forma, ser contada a partir de dois nomes: Ken Kutaragi, engenheiro veterano da Sony, e Hiroshi Yamauchi, então presidente da Nintendo.

Considerado o “pai do PlayStation”, o primeiro deles foi o “fator interno” que levou a Sony ao mercado dos games, responsável por convencer Norio Ohga, então presidente da companhia, e outros executivos descrentes sobre a importância de que a Sony entrasse neste mercado.

O segundo, por sua vez, foi o “fator externo” que levou a empresa ao PlayStation, responsável pela decisão que motivou a Sony a começar a desenvolver seu próprio console. Mas vamos por partes, já que o PlayStation não foi um projeto que surgiu da noite para o dia.

Apesar de nunca ter investido em uma grande iniciativa focada em games até o lançamento do PlayStation original, a Sony trabalhou pontualmente em uma série de iniciativas isoladas que a aproximaram do mercado de games – uma das mais importantes foi o desenvolvimento do chip de som SPC-700, usado no Super Nintendo (SNES), no final da década de 1980.

A parceria bem-sucedida com a Nintendo abriu espaço para Kutaragi trabalhar em outra iniciativa junto à empresa de Super Mario Bros., desta vez para a elaboração de um leitor de discos para o SNES, o SNES-CD (abreviação de Super Nintendo CD-ROM System), em 1988.

O projeto tinha como objetivo atualizar o SNES para torná-lo compatível com CD-ROMs, uma mídia mais moderna e com maior capacidade de armazenamento quando comparada aos cartuchos de jogos. A iniciativa, no entanto, desandou por conta dos termos do acordo.

Nos termos da parceria, todas as taxas de licenciamento do periférico e também dos CDs iriam para a Sony. Além disso, o acordo também permitiria que a Sony desenvolve um console independente, o SNES PlayStation (ou ainda Nintendo PlayStation), que rodaria não apenas os jogos em CD como também os cartuchos do SNES.

Interessada na ideia de produzir seu próprio console nos termos da parceria, a Sony apresentou à imprensa um protótipo do Nintendo Play Station (separado) em 1991, durante a Consumer Electronics Show (CES).

O episódio levou Yamauchi a rever os termos do acordo, que julgou favorecer demais à Sony – que ficaria com todos os royalties de jogos produzidos para o SNES-CD. O executivo resolveu então deixar a companhia para trás e fechar uma nova parceria com a Philips para o projeto.

Com o fim da parceria com a Nintendo, a Sony ainda tentou se aproximar da Sega para um projeto em conjunto, mas acabou optando pelo caminho solitário depois da tentativa não dar certo, adotando o nome PlayStation (tudo junto) para desenvolver um console de próxima geração – sob os auspícios de Ohga e liderança de Kutaragi, é claro. Estava dado o primeiro empurrão da Nintendo para fazer o PlayStation acontecer.

Yoshikazu Tsuno/AFP

O desenvolvimento e a chegada

O fato de estar sozinha na empreitada e de ter pouca experiência prévia com o desenvolvimento de consoles – e zero experiência na criação de um console a partir do zero –, levou a Sony a tomar algumas decisões complicadas ao longo da produção do PlayStation – ainda que, no futuro, várias delas viriam a ser chave para o sucesso do console.

A primeira dessas decisões foi fazer do PlayStation uma máquina concebida para jogos em 3D, o que colocou seu hardware em linha com a migração que a indústria já começava a fazer dos sprites em 2D para gráficos em três dimensões.

Segundo produtores que trabalharam no PlayStation original, aliás, a inspiração para a adoção do 3D veio de um jogo específico: Virtua Fighter, título de luta lançado para arcades no Japão em 1993 que impressionou tanto os desenvolvedores do console que fez a Sony apostar suas fichas na terceira dimensão. Por consequência disso, o PlayStation também adotaria o icônico CD-ROM com traseira na cor preta como mídia padrão, já que as exigência de armazenamento de jogos com gráficos em 3D não seriam compatíveis com cartuchos tradicionais.

Outra decisão importante que foi chave para o sucesso do PlayStation original foi seu modelo de publicação de jogos. Como a Sony chegou atrasada na festa do desenvolvimento de games quando comparada às rivais, não tinha uma estrutura sólida de estúdios para suportar seu novo videogame com títulos já no lançamento.

Isso levou a companhia a optar por taxas de desenvolvimento menores para seu console, além de um suporte e assistência mais próximos dos produtores para estimulá-los a trazer jogos para o sistema. Com mídias mais baratas e royalties menores, desenvolver e lançar games para o PlayStation uma vez que ele foi lançado se tornou muito mais em conta, o que acabou tornando-o mais interessante para produtores.

Reprodução/Naughty Dog

Na prática, isso se manifestou no portfólio invejável que o PlayStation original teve ao longo de sua vida útil, que incluiu uma série de títulos icônicos, como Crash Bandicoot, Tomb Raider, Metal Gear Solid, Gran Turismo e, é claro, Final Fantasy VII – jogo que, aliás, foi originalmente pensado como um título de Nintendo 64, mas acabou lançado para o PlayStation pela então Square por conta do suporte ao CD-ROM do console.

Além dessas duas decisões acertadas, um terceiro fator ajudou a consagrar o PlayStation original: sua acessibilidade. Conforme a quinta geração de consoles se aproximava, a Sony tinha a Sega como principal rival para seu novo console, já que o Sega Saturn, sucessor do bem-sucedido Mega Drive, também estava em produção e tinha lançamento previsto para o final de 1994.

No Japão, os dois consoles foram lançados em uma janela próxima e tiveram uma boa briga nos meses seguintes. No mercado dos Estados Unidos, no entanto, a história foi bem diferente, marcada pela tragédia que foi o lançamento do Saturn, ajudando a consolidar o console da Sony como o grande representante da nova geração.

Pressionada pela Sega do Japão a lançar o Saturn no mercado norte-americano o quanto antes para ganhar terreno antes da chegada da Sony, a Sega dos Estados Unidos decidiu antecipar o lançamento do console no país, mesmo que parceiros de varejo e desenvolvedores não estivessem prontos para isso.

Em 11 de maio de 1995, durante a E3 daquele ano, Tom Kalinske, presidente da Sega dos EUA, revelou que as primeiras unidades do Saturn seriam lançadas naquele mesmo dia, bem antes do lançamento originalmente previsto para o final do ano. O preço: US$ 399.

Ainda que o interesse no console fosse real, seu lançamento antecipado se provou um tiro no pé para a Sega. Com poucos jogos disponíveis, poucas máquinas em lojas e um preço relativamente alto, o Saturn teve um lançamento confuso nos EUA, que deu tempo para a Sony se preparar para um lançamento muito melhor estruturado. O primeiro golpe da Sony na Sega, aliás, veio minutos após o anúncio atrapalhado do Saturn.

Com esse empurrão da Sega, naquela mesma E3 de 1995, durante sua conferência de imprensa, a Sony precisou de apenas um preço para colocar o primeiro prego no caixão do Saturn: US$ 299. O icônico anúncio do preço do PlayStation original (veja abaixo), feito por Steve Race, chefe de desenvolvimento do console, colocou o trem do hype pelo console em movimento nos Estados Unidos e ajudou a sedimentar o sucesso do console no mundo.

O legado

Tudo isso, é claro, se traduziu em números. Ótimos números.

Ao longo de todo sua vida útil, o PlayStation vendeu mais de 102 milhões de unidades – incluindo 28 milhões de unidades do PSOne, versão “slim” do console lançada em julho de 2000.

O resultado fez do PlayStation o console dominante da geração, superando em muitos milhões as vendas do Nintendo 64 (32,93 milhões de unidades) e o Sega Saturn (9,26 milhões). No ranking atualizado, o PlayStation original é hoje o quinto sistema mais vendido da história dos consoles de videogames, atrás apenas do PlayStation 2, Nintendo DS, Game Boy/Game Boy Color e PlayStation 4.

É quase desnecessário dizer, mas não há dúvidas que ao fim da quinta geração de consoles, a Sony estava em uma posição bem diferente daquela de 1994. Líder incontestável de mercado com o PlayStation original, a empresa soube cavar seu espaço em uma indústria disputadíssima– e, é claro, carregar esse sucesso para as gerações seguintes.