O Cartoon Network é conhecido por vários games baseados em seus desenhos animados, como Hora de Aventura e Steven Universo. Mas a partir desta quinta-feira (19), a emissora segue o caminho contrário, e passa a exibir uma animação inspirada num jogo — o brasileiro Ninjin: Clash of Carrots.

Batizada apenas de Ninjin, a série de TV tem cinco episódios de 7 minutos cada que vão ao ar em sequência a partir das 20h (horário de Brasília).

Mas além de sagrar a coprodução de Pocket Trap, uma pequena desenvolvedora de games de São Paulo, e Birdo, estúdio de animação responsável por criar os mascotes dos Jogos Olímpicos do Rio, a estreia busca ser um pontapé para "algo maior" para os games brasileiros.

"Sempre tivemos essa vontade de explorar quadrinhos, animação, mas só éramos três moleques fazendo jogos", diz Henrique Caprino, cofundador da Pocket Trap e produtor executivo da animação.

"Foi um aprendizado enorme em termos de orçamento, produção. E o valor agregado para nós é incrível. Estou usando isso para alavancar nossos próximos projetos autorais. A Pocket Trap não quer mais fazer só jogos, mas propriedades intelectuais", conta.

Games e um tiquinho assim de cartum

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Cartoon Network/Divulgação

Lançado em setembro de 2018 para PC, PlayStation 4, Xbox One e Nintendo Switch, Ninjin: Clash of Carrots é um jogo de ação que combina ninjas, estética de anime e generosas doses de bom humor.

A animação segue a mesma linha, mas se passa um pouco antes dos eventos do jogo, e acompanha a infância de seus personagens: o coelho Ninjin, a raposa Akai e o sapo Flink, além do mestre Sensei, o vilão General Jam e o comerciante Corgi Jr.

Também foi um pouco antes que começou a história do projeto. Em 2015, a Pocket Trap desenvolveu alguns jogos para o site do Cartoon Network e conheceu Artur Tilieri, responsável pelo conteúdo digital do canal.

Naquele mesmo ano, Roger Keesse, futuro roteirista e coprodutor do desenho animado, esbarrou no trabalho de Rodrigo Zangelmi, diretor de arte da dev, em um desafio na internet de ilustrações de Pokémon.

Keesse e Pocket Trap acabaram firmando uma parceria que gerou um piloto de Ninjin para a Nickelodeon, que não foi aproveitado. Mas o material interessou Tilieri, que ajudou a organizar reuniões com o pessoal de animações do Cartoon Network até o projeto ser aprovado, de outra forma, entre 2017 e 2018.

"Eles não queriam fazer uma série convencional com temporadas de 15 episódios de 11 minutos. Ao invés disso, usaram o Ninjin para testar algo que passasse em vários lugares ao mesmo tempo", diz Caprino.

O resultado são 22 episódios divididos em três formatos: os cinco de 7 minutos que estreiam nesta quinta (19) na TV, outros 10 episódios de 1 minuto para redes sociais como Instagram, e mais sete de 3 minutos que estão publicados no canal no YouTube do Cartoon Network.

Cenouras à obra

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Cartoon Network/Divulgação

Como a Pocket Trap conta apenas com quatro membros, a Birdo, que também tem no currículo os desenhos Oswaldo e Cupcake & Dino: Serviços Gerais, entrou como coprodutora e herdou o trabalho de storyboard, animação, direção e cenários, além da contratação do elenco de voz.

Já a parte criativa da série continuou sob responsabilidade de Keesse, que assina os roteiros, e da própria desenvolvedora, que segue como detentora dos direitos sobre o game original.

"A gente sempre tentou inserir elementos do jogo. Como a animação de um novo inimigo chegando e a dos combos. Ao mesmo tempo, não quisemos que isso se tornasse uma limitação pro Roger e pra série. Então ele teve liberdade criativa", afirma Caprino.

Já Rodrigo Zangelmi elaborou um documento para a Birdo com referências de animações, ângulos diferentes de cada personagem e todos os objetos pensados por Roger nos roteiros.

Ser diferente do material original, na verdade, também foi uma forma do estúdio proteger a propriedade sobre o mundo que criou. Ninjin e companhia são adolescentes no jogo, mas crianças na animação, como uma forma de mudar o design dos personagens e, assim, distinguir as duas obras.

"Sempre me preocupei com o fato de série e jogo compartilharem personagens. Se a gente fizer um Amiibo de Clash of Carrots, por exemplo, não quero que Cartoon Network ou Birdo tenham qualquer relação. Da mesma forma que a Modus Games, a publisher do game, não exija nada sobre a série", conta o cofundador da Pocket Trap.

Sucessos, desafios e surpresas

A estreia dos episódios para YouTube de Ninjin, em 4 de setembro de 2019, coincidiu com o aniversário de 1 ano de Clash of Carrots. Mas enquanto a animação registra bons números na plataforma de vídeos, somando em 15 dias 674,4 mil visualizações entre os canais do Cartoon Network no Brasil e na América Latina, o jogo ainda rala para encontrar sucesso.

Henrique Caprino conta que, até o último relatório enviado pela distribuidora Modus Games, Clash of Carrots ainda não retornou em vendas o investimento feito pela publisher.

"Eu sabia que seria difícil e não me arrependo. Eles foram um parceiro inusitado por serem da Maximum Games, que distribui jogos grandes como Farming Simulator, mas tinham o que a gente procurava na época. Que era um investimento, uma garantia de que não quebraríamos a cara", diz.

Caprino também admite que Clash of Carrots é um título difícil de divulgar: "O fato do cenário se mover lateralmente sempre foi uma pedra no sapato porque as pessoas assimilam com jogos 'runner', de celular. E a gente está vendendo um jogo para consoles e PC".

De qualquer forma, ele lamenta que a divulgação do game por parte da Modus não tenha recebido mais atenção — especialmente tratando-se de um título para Switch, plataforma que a Pocket Trap apostava suas fichas e onde as vendas de Clash of Carrots, segundo Caprino, foram quatro vezes superiores que as demais.

Ninjin também foi distribuído no Japão em um acordo com a Arc System Works, publisher e desenvolvedora de Dragon Ball FighterZ e da série BlazBlue. Os números no Oriente, porém, ainda não foram divulgados.

"Consigo medir pelo que fuço na internet. Uma jogadora japonesa enviou uns prints comparando os elementos de Clash of Carrots com os da animação, achamos muito legal", ele comemora.

Por outro lado, Caprino se surpreendeu com a reação do público aos episódios de Ninjin postados no YouTube. "A gente está acostumado com a recepção tóxica ao jogo brasileiro. Mas é só abrir os comentários: é um hater para 100 mensagens positivas."

Próximo passo: queimada RPG

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Spcine/Divulgação

Agora, a Pocket Trap foca as atenções em seu próximo game, Dodgeball Academia. O projeto foi um dos vencedores do Edital de Games 2016 promovido pela Empresa de Cinema e Audiovisual de São Paulo, a Spcine, e levou R$ 150 mil.

Na esteira de jogos de esporte com história, como Golf Story e o Mario Tennis de Game Boy Color, Dodgeball Academia une partidas do jogo de queimada a elementos de RPG em um cenário escolar.

"Serão 14 episódios com uma missão principal e várias paralelas, incluindo algumas para você conhecer melhor os personagens, como em Mass Effect 2", indica Caprino.

Segundo o cofundador da Pocket Trap, uma versão jogável de Dodgeball Academia foi enviada nesta semana para a avaliação de distribuidoras que possam vir a financiar o restante do projeto.