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Activision contrata chefe de compliance que fazia apologia a tortura

Frances F. Townsend foi um dos principais rostos da Guerra ao Terror na era Bush

Por Daniel Trefilio 03.03.2021 17H19

A Activision Blizzard anunciou no dia 02 de março que contratou como chefe de compliance Frances F. Townsend, ex-consultora do Departamento de Segurança Nacional durante segundo mandato de George W. Bush enquanto presidente dos Estados Unidos. Além de sua nomeação para o cargo em 2004 pelo ex-presidente para coordenar a campanha da “Guerra ao Terror” dentro do departamento criado pelo próprio Bush, Townsend esteve na lista de Donald Trump para Diretora de Inteligência Nacional ou Secretária de Segurança Nacional.

Ainda que os devidos cargos soem como boas referências, o problema começa quando se leva em consideração que Townsend era defensora de “técnicas aprimoradas de interrogatório”, um eufemismo para técnicas de tortura e outras práticas condenadas pelo Tribunal dos Direitos Humanos.

O departamento recém assumido por Townsend tem por objetivo, além da regulamentação de práticas e condutas dentro das empresas para evitar comportamentos antiéticos, espionagem industrial, controle de informações privilegiadas, é garantir que a Activision Blizzard não caia em conflitos legais devido as inúmeras legislações diferentes dos países com os quais a produtora de jogos, muitas vezes controversos, como Call of Duty possui acordos de negociação.

Divulgação / Activision Blizzard

Em entrevista ao The Wall Street Journal, os dois principais focos, foi enfatizado que o principal foco de Townsend no novo cargo é garantir ao máximo a privacidade dos dados da base de jogadores e monitorar e analisar as regulamentações de cada país sobre práticas de monetização como loot boxes, entre outras.

A intenção é evitar, por exemplo, que os jogos levem em consideração durante sua produção diversas questões que levariam os títulos a sofrerem sanções, recaírem sob classificações etárias mercadologicamente restritivas ou mesmo, retomando o exemplo das loot boxes, que possam ser enquadrados como jogos de azar, que passam por regulamentações e restrições mais intensas em diversos país.

Riccardo Savi / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP

O não menos polêmico CEO da Activision Blizzard, Robert Kotick, citado por nome em lista de associados a Jeffrey Epstein na investigação por tráfico sexual e pedofilia, se posicionou em favor de Townsend por ter sido uma “servidora publica altamente estimada”. Kotick ainda se referiu a mais nova chefe de compliance como uma “líder transformacional”.

A campanha de “Guerra ao Terror”, desastrosa no quesito relações publicas durante a administração Bush, tinha como um de seus principais rostos Frances Townsend, tendo sido atribuído a ela o nível de risco de ataques terroristas durante a campanha de reeleição de George Bush em 2004, baseada em evidências já há muito defasadas.

O então chefe do Departamento de Segurança Nacional, Tom Ridge alegou ter sido politicamente pressionado para tomar tal decisão.
Além dele, o chefe de um complexo prisional, Abu Gharaib, também afirmou ter sido pressionado a intensificar os processos de interrogatório após visita de Townsend ao complexo.

Divulgação / Activision Blizzard

Em meio a diversos escândalos e práticas abusivas dentro dos diversos segmentos da indústria de jogos, ter uma pessoa com o histórico, extenso conhecimento, e defensora aberta de práticas coercitivas, para dizer o mínimo, a frente da regulamentação não apenas das operações globais, mas também das políticas de condutas internas, ambientes de trabalho e regimes de contratação da Activision Blizzard seria um retrocesso se não já não estivesse alinhado a outros posicionamentos recentes da empresa. 

Justamente por essa razão que a escolha, ainda que polêmica e preocupante, não é surpreendente, e enquanto diversas empresas do ramo dos games como Ubisoft e Electronic Arts estão, ao menos em teoria,  estão cada vez mais direcionando esforços para combater amplamente o estigma que a indústria carrega atualmente como um segmento de trabalho opressor, desumano, e palco para perpetuação de diversos preconceitos e agendas retrógradas e violentas, a Activision parece nem sequer reconhecer toda a problemática em torno de algumas de suas decisões executivas, indo na contramão da história da indústria que de maneira recorrente traz produções que criticam abertamente posicionamentos e agendas desse tipo.