Este artigo pode conter alguns spoilers da trama e de elementos que estão ou não no filme. Prossiga com a leitura por sua conta e risco!

Sonic the Hedgehog vai virar filme com atores reais!”. Se alguém me falasse isso quando eu era criança, lá pelos meus 6 anos de idade quando tive contato com a série de jogos do ouriço azul pela primeira vez, eu provavelmente não acreditaria. Ou, pelo menos, duvidaria.

Mas essa adaptação virou realidade. O filme estreia em 2020, quase 3 décadas depois do ouriço azul mais veloz dos videogames ganhar vida no MegaDrive. E, apesar da demora, por um lado é bom que tenha sido assim: Temos tecnologia avançada o bastante para gerar um Sonic em computação gráfica que consegue ser descolado e extremamente fofo ao mesmo tempo, enquanto interage com atores reais nas telonas.

E que bom também que ele está interagindo com seres vivos nas telonas. Apesar da narrativa central do filme ser simples (mas já falamos mais disso daqui a pouco), os humanos que aparecem no longa-metragem servem bem ao propósito de gerar identificação e familiaridade com quem está assistindo - e, em especial, com as crianças.

É uma fórmula que Pokémon: Detetive Pikachu também usou: os monstrinhos interagem com humanos no longa-metragem para facilitar a conexão entre o produto e consumidor, com o objetivo de fazer com que os espectadores simpatizem melhor com os personagens da trama. 

Depois de intensas polêmicas envolvendo o design inicial de Sonic na adaptação live-action, é realmente uma benção que Tyson Hesse, uma das principais mentes artísticas por trás da franquia do ouriço nos quadrinhos da Archie Comics e no game Sonic Mania e derivados, tenha sido chamado para auxiliar no novo visual.

É difícil não se encantar com o novo Sonic: seu redesign gera uma aceitação mais rápida e facilita na imersão de sua aventura. Ainda que exista espaço para melhoras (sempre tem) e que, de certa forma, haja uma resistência enraizada (e justificada) em cada gamer por conta de fracassos anteriores com outras adaptações de videogames; Sonic: O Filme é felizmente uma grata exceção.

Praticamente um filme de origem

Sonic: O Filme oferece um enredo básico: o Borrão Azul (excelentemente dublado por Ben Schwartz na versão em inglês) ganha uma nova origem e, logo no início da história, precisa fugir para o nosso mundo. Ele aterrissa na pacata cidade de Green Hills e cresce isolado por 10 anos, observando os moradores e se relacionando de longe com eles.

Seu comportamento elétrico - “ligado no 220V”, digamos assim - é justificável justamente por conta desse isolamento e da contínua solidão, afinal, o ouriço é o único de sua espécie em um mundo desconhecido. Dado isso, obviamente seu maior sonho é sentir que ele pertence a algum lugar.

Em paralelo, Tom Wachowski (interpretado por James Marsden) é o policial de bom coração que sente que precisa dar um sentido maior à sua vida. Ele é o grande amigo de Sonic no filme e a amizade dos dois cresce gradativamente usando de alguns clichês narrativos - uma viagem de carro e uma briga coletiva em um bar. Os dois se conhecem após Sonic acidentalmente causar um blecaute em uma parte do estado. A partir disso, o governo norte-americano aciona o vilão da história. E eis que Jim Carrey e seu excepcional Dr. Ivo Robotnik entra em cena.

O antagonista nada mais é do que um cientista de altíssimo QI. E, embora ele brilhe com suas invenções robóticas e seus diálogos se resumam a berros histéricos onde ventila que acredita mais em suas criações do que nos humanos; graças ao carisma de Carry, o personagem rouba a cena em praticamente todas as cenas em que aparece.

Não que o Dr. Robotnik fosse exatamente o personagem mais profundo mesmo nos jogos - com exceção talvez de Sonic Adventure 2, que aborda mais sua família -, mas no longa-metragem, porém, Carrey abraça perfeitamente o viés surtado do personagem e entrega uma atuação completamente digna de um cartoon. Em outras palavras, o achei perfeito no papel.

Ainda assim, a história é realmente bem simples e as temáticas são felizes e otimistas (para não dizer fofas); além de vermos o poder da amizade mais uma vez se mostrando uma poderosa arma. Dado isto, caso alguém esteja esperando abordagens mais sérias ou profundas, pode se decepcionar.

Imagem do cartaz oficial de Sonic: O Filme
Paramount Pictures/Reprodução

A dica é: vá de coração aberto e se permita se deixar levar pela nostalgia e pelo carisma dos personagens. Sonic: O Filme é basicamente uma história de origem do ouriço azul; o longa-metragem serve perfeitamente bem para introduzir o personagem a um novo público e ainda entrega uma aventura satisfatória e respeitosa para os fãs.

E, ainda que vejamos muito pouco do mundo do Sonic no filme, exista gancho para que isso seja revertido no futuro, felizmente.

Uma carta de amor

Vale ainda me repetir ao apontar como Sonic: O Filme é bastante respeitoso com a mitologia da franquia, conseguindo ainda apresentar elementos novos. O filme é inteirinho cheio de referências aos games (algumas até obscuras demais) e há easter eggs inclusive nas músicas - a canção orquestrada da perseguição de carro tem fragmentos que lembram o tema do Dr. Robotnik em Sonic the Hedgehog 2, por exemplo.

Obviamente, não é neste artigo que você vai ler spoilers pesados sobre o que acontece ou deixa de acontecer no filme, mas é seguro afirmar que os fãs vão reconhecer (e desconfiar) de muitas referências ao longo da narrativa.

(Talvez seja necessário assistir mais de uma vez para pegar todas, inclusive.)

Alguns elementos da mitologia de Sonic, porém, não aparecem - como as Esmeraldas do Caos e os animais presos dentro das máquinas do Dr. Robotnik. Novamente, é uma adaptação leve que serve de introdução do personagem para um público maior, indo muito além dos videogames.

Imagem do cartaz oficial de Sonic: O Filme
Paramount Pictures/Reprodução

Então, não há espaço para que estes dois elementos sejam mostrados. Ainda assim, o filme faz um ótimo trabalho em estabelecer e mostrar o que é e como o Sonic é; além de deixar brechas para que o mundo do ouriço e tudo que vem junto, apareça numa possível continuação.

Aliás, outra dica: fique para ver os créditos. Não vai se arrepender!