Resident Evil 6 dividiu opiniões pela indecisão. A Capcom, no interesse de atingir o maior público possível, arriscou-se em três ritmos de jogo distintos para o seu grande revival da franquia outrora tão unanimamente apreciada. Apostou no que parecia um tiro certeiro... três narrativas distintas, todas com a duração de um jogo convencional, que se cruzam em alguns pontos, contando uma só grande história. Na ideia simples, um pacotão deveria agradar todos os tipos de jogadores - os fãs do terror de sobrevivência do início da série, os da correria da fase Nemesis e os que apreciam a ação explosiva, a la Michael Bay, de Resident Evil 5.

Resident Evil 6

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Dishonored

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Dishonored

Resident Evil 6

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Resident Evil 6

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A ideia - o teste - foi louvável, mas se Resident Evil 6 provou alguma coisa nesta superlotada temporada de jogos, foi que os fãs querem coerência. A crítica encarou positivamente as mudanças, dando ao jogo notas ligeiramente acima da média, mas o público foi implacável, colocando este entre os piores jogos da série, ao lado do infame Resident Evil: Operation Raccoon City. Algo curioso, já que há jogo para todos os gostos (ninguém é obrigado a experimentar todas as campanhas, de Leon, Jake ou Chris - nem mesmo a bônus, com Ada Wong) e a ideia de usar outros jogadores através da conexão de internet para o jogo colaborativo que se cruza em momentos-chave da história é boa demais para ser ignorada. Então por que tamanha resistência por Resident Evil 6?

Nesse peso negativo, além da mecânica equivocada - que dá aos jogadores as mesmas ferramentas para tipos distintos de game - há muito do sentimento nostálgico do que a série um dia representou, claro, mas tira-se daí que uma franquia deve ser muito mais que a repetição de personagens, criaturas e cenários: deve significar alguma coisa. E nesse significado, Resident Evil se perdeu. A série é survival horror, é de ação, estrelada pela Milla Jovovich ou o quê?

No mundo de hoje, em que séries existem aos montes e disputam atenção em temporadas repletas de jogos na prateleiras, filmes em cartaz, seriados na TV e quadrinhos e livros nas lojas, propriedades intelectuais viraram uma extensão de personalidade. Elas são "curtidas" - e esse curtir fica registrado como parte de sua identidade online -, então como dar um aval aos seus amigos e seguidores de algo que não valeu o tempo investido nela? Nem é mais uma questão de dinheiro gasto, já que a pirataria cuidou disso. Ao dizer "sou para todos", Resident Evil 6 acabou é tornando-se uma propriedade genérica, sem personalidade.

No outro espectro da temporada, surgiu Dishonored. O jogo da Bethesda e do Arkane Studios despertou interesse desde os primeiros teasers por apostar em um subgênero da ficção científica, o steampunk, que ainda é pouco utilizado na cultura pop em comparação com outras vertentes.

Normalmente, no steampunk, o período histórico da Inglaterra Vitoriana (1830-1901) recebe uma carga de tecnologia, evoluindo-o antecipadamente ao equivalente à metade do século XX, com algumas evoluções alternativas, mais futuristas. Essa ambientação não é nova nos games, já tendo servido de pano de fundo - em maior ou menor grau - em jogos como American McGee's Alice, BioShock, alguns Final Fantasy, Myst e outros.

A narrativa, porém, é certeira. Dishonored conta a história de Corvo, o antigo guarda-costas da imperatriz, culpado por um crime que não cometeu - justamente o assassinato de sua antiga empregadora. Liberado por um grupo de conspiradores contra o novo regime, o guerreiro furtivo (ou não, a escolha é do jogador) precisa cumprir missões para revelar os verdadeiros assassinos e desvendar as razões nefastas pelas quais ela foi morta, tudo em meio à maior crise de saúde que o império passa: uma praga de ratos que mata quem tem mais sorte e transforma em verdadeiros zumbis os menos afortunados.

A história é como tantas outras - vingança, conspirações, etc - e em termos de mecânica, Dishonored também não é inovador. Mistura magia e tecnologia como Fable 3 o fez há poucos anos e lembra bastante Bioshock. No entanto, o faz perfeição, possibilitando inúmeras abordagens para as missões, com terrenos que favorecem estilos de jogo distintos. Os fins são os mesmos (com pequenas alterações no desfecho dependendo de seu comportamento), mas os meios são indivividualizados. É um game em que a consisão é chave, portanto. O foco é na narrativa, que, como Resident Evil 6 é bem linear, mas dá-se ao jogador criatividade no uso das mecânicas.

Enquanto entretém, Dishonored também disvirtua o próprio steampunk. Os críticos do subgênero afirmam que muitas das obras criadas dentro dele têm um apreço um tanto perturbador pelo imperialismo, ignorando todos os malefícios dessa política de governo (escravatura e pragas são frequentemente ignorados). Pois Dishonored encara de frente o problema e faz das críticas seu mote.

Ao dizer exatamente quem é, a que veio e ao sugerir mudanças dentro do próprio subgênero a que pertence, Dishonored desponta como algo que, mesmo que não exatamente novo, merece interesse. Resident Evil, por sua vez, precisa enfrentar sua crise de identidade e escolher: retorna às origens, agradando os consumidores fiéis, ou ignora os antigos fãs em busca de novos? De qualquer maneira, a Capcom precisa urgentemente devolver identidade à franquia.