Após colocar as mãos na versão final de Dreams, não é difícil entender por que o novo projeto dos criadores de LittleBigPlanet demorou 7 anos entre anúncio e lançamento.

Mais do que um mero jogo, Dreams também é uma ferramenta para a criação de jogos - e a melhor de seu tipo.

Dando sequência ao legado de LittleBigPlanet (que já no PlayStation 3 misturou plataforma e criação de fases, muito antes de Super Mario Maker), o novo título dos britânicos da Media Molecule chega ao PlayStation 4 com a missão de dar asas ao espírito criativo dos jogadores. Munidos com um poderoso e intuitivo modo de criação, eles conseguem criar jogos de quaisquer gêneros, filminhos de animação e até mesmo experiências visuais e auditivas mais esotéricas e difíceis de rotular.

As ferramentas criativas de Dreams funcionam exatamente como eu, quando criança, imaginava que o desenvolvimento de novos jogos funcionava. Dadas as devidas proporções de tempo investido, a experiência de criar algo no game é equivalente à de fazer um desenho no MS Paint. É fácil pegar o pincel e rabiscar algo na tela, da mesma maneira que é fácil utilizar o bichim (seu cursor animado em Dreams) e criar uma plataforma sobre a qual o protagonista do seu jogo pode andar. Considerando a diferença de complexidade entre as duas formas de expressão criativa, é notável a maneira como Dreams nunca perde a simplicidade.

Review Dreams
Divulgação/Sony

E o bichim é a chave para tal simplicidade. Nem de perto tão cativante quanto o Sackboy de LittleBigPlanet, o cursor também serve como o mascote de Dreams. Basicamente todas as ações realizadas no modo criativo ocorrem ao redor da pequena criatura, que deve ser controlada com um misto entre o uso dos direcionais analógicos e dos sensores de movimento do controle DualShock 4 (a experiência fica ainda mais intuitiva com dois controles PlayStation Move, mas estes já são caros e raros no Brasil).

Desde que o jogador se atenha a propostas mais simples, é possível criar um joguinho de plataforma com uma ou duas fases em poucas horas com a ajuda das instruções iniciais que o jogo oferece.

Caso o interesse em criar algo mais complexo esteja lá, claro, é possível mergulhar de cabeça nos tutoriais avançados. São horas e horas de guias, devidamente narrados em português do Brasil e incluindo o humor fofinho característico da Media Molecule. Quem se forma na pós-graduação em Dreams logo se vê capaz de personalizar projetos nos menores detalhes, criando mecânicas de jogo e efeitos sonoros inéditos, alterando as propriedades da física de um cenário, e muito mais.

Dreams como um jogo

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Divulgação/Sony

Naturalmente, Dreams também pode ser aproveitado como um jogo normal. Além das inúmeras criações feitas por usuários, também é possível explorar algumas fases (e sequências de fases) concebidas pelos próprios designers da Media Molecule - como “O Sonho de Art”, uma campanha de cerca de duas horas de duração que viaja por dezenas de experiências de jogo diferentes, criadas exclusivamente com as mesmas ferramentas criativas disponíveis para os usuários finais.

O maior problema de Dreams, porém, surge quando é hora de explorar o faroeste das criações dos usuários. Existem experiências incríveis ali no meio - principalmente dentre as mais bem avaliadas pela comunidade -, mas a maioria esmagadora de sonhos parece ter sido publicada antes da hora, sofrendo com problemas técnicos ou ambições não realizadas. Muitas delas até avisam o jogador: “essa obra está incompleta.”

Desbravar o mundo selvagem dos sonhos é muitas vezes frustrante, ainda que ver os tropeços dos demais jogadores seja uma ótima maneira de aprender o que você não deve fazer na hora de criar suas próprias fases. E a Media Molecule ainda não oferece uma curadoria aguçada o suficiente para satisfazer quem chega de paraquedas no mundo de Dreams e só quer aproveitar uma boa sequência de sonhos finalizados e bem feitos. Felizmente, o comando para “pular” um sonho que você não curtiu é bem rápido.

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Dreams é melhor aproveitado por aqueles que alternam seu foco entre a criação e a exploração de criações alheias, mas também pode servir para pessoas que só têm interesse em uma das facetas do jogo.

Por outro lado, é difícil imaginar que Dreams consiga prender a atenção de alguém que não tenha nem a paciência necessária para criar experiências, nem a tolerância aos problemas e bugs inevitáveis no conteúdo criado por outros jogadores. Para realmente se divertir neste jogo, é necessário um certo desapego; se ficar preso em meio à geometria de um cenário te irrita mais do que te faz rir, Dreams provavelmente não é o jogo para você.

Dreams é uma obra monumental, mas não da maneira tradicional. É preciso abrir o capô metafórico do jogo e ver tudo o que está rolando ali embaixo para realmente apreciar todo o esforço investido pela Media Molecule no projeto nesta última década. Com toda a sorte, a versatilidade do game permitirá que ele dure pelo menos mais uma década - desta vez recebendo de braços abertos os esforços de outras mentes criativas: as dos jogadores.

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Dreams
  • Lançamento

    14.02.2020

  • Publicadora

    Sony Interactive Entertainment

  • Desenvolvedora

    Media Molecule

  • Gênero

    Criação

  • Testado em

    PlayStation 4

  • Plataformas

    PlayStation 4

Nota do crítico