Eu sou um fã relativamente recente de Yakuza.

Sei da existência da série desde os tempos do PlayStation 2 e meu interesse sobre ela cresceu com o passar anos - particularmente por volta do lançamento do Yakuza 5 no Ocidente -, mas só acabei mergulhando na saga de Kazuma Kiryu e seus amigos em 2017, com Yakuza 0.

Neste pouco mais de um ano, porém, a franquia acabou virando uma mini-obsessão, e uma das minhas propriedades intelectuais favoritas da Sega, possivelmente atrás apenas de Persona.

Por isso, estava ansioso para a chegada de Yakuza 6: The Song of Life ao Ocidente, aventura final do protagonista Kazuma Kiryu (não, isso não é um spoiler). E, embora tenha seus tropeços e problemas, o novo game é uma excelente jornada e adeus ao Dragão de Dojima.

(Desculpa...)

De volta às ruas

Yakuza 6 começa logo após os eventos de seu predecessor, com Kiryu entre a vida e a morte e sua filha adotiva e aspirante a diva pop, Haruka, admitindo ao público que foi criada por um criminoso.

Para impedir que uma guerra de gangues tome as ruas de Tóquio, Kiryu aceita cumprir uma pena de 3 anos na prisão enquanto Haruka, com sua carreira em frangalhos, desaparece poucos meses depois.

Ao sair da prisão, o ex-yakuza é forçado a voltar às ruas do distrito de Kamurocho - palco central de boa parte da série - em busca de Haruka, descobrindo não só que ela está em coma após um acidente de carro, como também tem um filho, Haruto, cuja identidade do pai é um mistério.

Querendo descobrir o que realmente aconteceu com Haruka, Kiryu parte em uma jornada que o leva tanto pelas ruas e becos de Kamurocho como para a pitoresca cidade de Onomishi, na região de Hiroshima, conhecida por sua pescaria e templos.

Mas, como sempre na vida do Dragão de Dojima, há segredos e conspirações muito maiores por trás destes eventos e ameaças mortais a serem enfrentadas - geralmente caindo na porrada com dúzias de capangas.

Talvez o resumo acima soe como informação demais, mas Yakuza 6 faz um ótimo trabalho em destrinchar a mitologia da franquia, apresentando e explicando o conflito central, e sem falar nas diversas reviravoltas que marcam sua trama.

Melhor ainda, para quem (como eu) não tem tanta familiaridade sobre como a história chegou a este ponto, o menu inicial traz uma sessão especial que resume os games anteriores da série.

A estrutura narrativa também foi significativamente simplificada em relação a seus antecessores. Em Yakuza 6, o jogador só tem controle de Kiryu, e muito do elenco coadjuvante apresentado até então é colocado de lado - o que imagino ser um problema maior para fãs de longa data, especialmente para quem gosta de personagens como Taiga Saejima e Daigo Dojima.

(Até eu, novato que sou, senti saudades de Goro Majima, que após ser uma figura central em Yakuza 0 e um inimigo recorrente - para dizer o mínimo - em Kiwami, tem uma participação pequena por aqui)

Por outro lado, os personagens apresentados neste jogo são interessantes e divertidos por si só, com destaque para o icônico Beat Takeshi como um líder de uma família mafiosa de Onomishi que serve como alívio cômico, mas tem seus próprios segredos.

Não diria que funciona como um ponto inicial tão bem quanto 0 ou até Kiwami, mas Yakuza 6 consegue se estabelecer como uma narrativa relativamente fechada e redonda. A única questão envolvendo o público brasileiro é que o jogador precisa entender inglês (ou, quem sabe, japonês), já que ele não teve tradução em português.

Só fico chocado que ele não tenha aparecido antes, levando em conta seu "glorioso" passado nos games

Guia turístico

A estrutura de Yakuza 6 mantém o modelo clássico da série, com um mundo aberto repleto de de atividades, missões paralelas e gangues de capangas arruaceiros que invariavelmente acabam cruzando seu caminho, antes de invariavelmente apanharem feio de Kiryu.

Mesmo juntos, os mapas de Kamurocho e Onomichi não têm perto da extensão de qualquer jogo da Ubisoft feito nos últimos anos. Mas o que lhe falta em espaço é compensado pela riqueza de detalhes, e pelo número de atividades diversas que o jogador pode encontrar em diferentes locais - que podem ser apreciadas pelo modo em primeira pessoa implementado no jogo.

Não só isso, por ser o primeiro jogo da série desenvolvido exclusivamente para o PlayStation 4 (0 e Kiwami foram lançados também para PS3 no Japão), a cidade é ainda mais viva e crível, já que agora não há telas de loading ao entrar em lojas, restaurantes e outros estabelecimentos… o que também quer dizer que as lutas podem ir para dentro destes lugares, para desgosto dos funcionários.

No decorrer da história, o jogador pode visitar arcades cheios de jogos da Sega - de clássicos como OutRun e Space Harrier até títulos modernos como Virtua Fighter 5 e PuyoPuyo -, malhar em uma academia (que ainda te oferece dicas de alimentação), pescar em alto mar, formar amizades em um bar - basicamente uma versão japonesa de Cheers -, gerenciar seu próprio time de baseball, encontrar gatos de rua para um café e por aí vai.

Há também o mais próximo do que Yakuza vai chegar do gênero de estratégia em tempo real com o Creator Clan, modo em que o jogador pode enviar até 100 capangas para lutar nas ruas, seja contra a sinistra JUSTIS - liderada por versões fictícias de membros da liga de luta livre japonesa New Wrestling Pro-Japan - ou até em batalhas online.

E, é claro, Karaokê

Muitas destas atividades acabam servindo como diferentes minigames - a pesca é um rail shooter, o baseball é um manager básico com a ocasional rebatida do jogador -, mas acabando trazendo uma variedade extra ao ritmo normal de jogo.

Outro atrativo à parte são as missões paralelas, que vão desde interagir com uma menina que acredita ter voltado no tempo, perseguir um drone pela cidade, enfrentar o restante de uma gangue que Kiryu aniquilou anos atrás, se vestir como o mascote de Onomichi, e basicamente reproduzir a premissa do filme Ela se a personagem de Scarlett Johansson fosse a Skynet de O Exterminador do Futuro.

Estas missões trazem uma mistura curiosa de humor, bizarrice e melodrama - e pancadaria, claro -, que servem como descontração para a gravidade e seriedade da maior parte da narrativa principal do game.

Quebrando tudo

Yakuza 6 trouxe mudanças significativas ao seu sistema de combate em relação aos últimos predecessores.

Ao contrário de 0 e Kiwami, que implementaram um sistema de troca de técnicas de luta, no novo jogo Kiryu tem um único estilo de combate, com um ou outro golpe que lembre os modelos anteriores - particularmente durante o Extreme Heat Mode, em que o jogador pode canalizar a fúria do personagem para esmagar seus inimigos.

É um sistema funcional, divertido de manipular e, até certo ponto, “fácil de aprender e difícil de dominar”, mas senti falta da versatilidade dos outros jogos. Neles, com o tempo, aprendi a estabelecer estratégias e mudar de estilo conforme o tipo de inimigo e até o ambiente em que me encontra. Yakuza 6, por outro lado, é bem mais simplista, e com exceção de algumas poucas lutas, não precisei pensar muito no que fazer para derrubar os oponentes.

Os níveis de progressão, em contrapartida, ficaram um pouco desnecessariamente complexos. Agora há 5 elementos diferentes - Strength, Agility, Spirit, Technique e Charm - que podem ser ganhos de formas diferentes, de combate a atividades paralelas às refeições dos restaurantes e mercados espalhados por Kamurocho e Onomichi.

O problema é que, mesmo ao liberar boosts e outras formas de aceleração de ganho de pontos, algumas destas categorias avançam mais rápido do que outras, o que cria um tipo bizarro de grinding em que é preciso comer e fazer repetidamente habilidades que não sejam a de espancar outros.

E, já que estamos na área das críticas, é impossível não citar as questões de performance do jogo. A taxa de quadros aqui é de apenas 30 fps, ao contrário dos 60 fps de Yakuza 0, e ela não chega perto de ser estável.

Não só isso, no meu PS4 a resolução é de apenas 900p, trazendo bordas gigantes na tela de uma TV Full HD. Apenas no PS4 Pro o jogo chega a rodar a 1080p ou até 2160p (ainda com 30fps).

O dragão dá adeus

Mesmo com estes pesares, Yakuza 6: The Song of Life ainda prendeu minha atenção e vontade de jogar como poucos games. Ele traz uma aventura vasta, engajante, emocionante e divertida até que, na reta final, eu começava a procurar novas coisas a se fazer para não terminar a narrativa.

(Por sorte, há um pós-jogo e até um New Game Plus para quem está preocupado com isto)

Não seria o primeiro jogo da série que recomendaria para novatos, já que tanto Yakuza 0 quanto Kiwami não são apenas melhores pontos de entrada, como também jogos superiores.

Ainda assim, para quem já está investido na franquia, o game é uma boa conclusão para a saga do Dragão de Dojima, enquanto mantém a porta aberta para novas histórias no submundo do crime japonês.

Yakuza 6: The Song of Life é exclusivo de PlayStation 4. O jogo foi testado em um PlayStation 4 padrão.

Nota do crítico