Depois de usar o Nintendo 3DS para nos dar um gostinho da boa e velha Squaresoft dos anos 1990, Bravely Default retorna para tentar convencer o mundo de que, sim, ainda vale a pena jogar RPGs por turnos em 2021.

No Switch, Bravely Default II mistura nostalgia e modernidade para criar uma experiência confortável, mas ousada, mas que sofre por não completar muito bem a transição dos portáteis para os consoles de mesa.

Divulgação/Nintendo

Apesar de carregar o número 2 no nome, Bravely Default II não requer nenhum conhecimento prévio para ser aproveitado. Da mesma maneira que Final Fantasy VIII não tem nada a ver com as desventuras de Cloud e seus amigos em Final Fantasy VII, o novo jogo se passa em um mundo inédito e estrela heróis de primeira viagem.

A história acompanha as perspectivas de quatro aventureiros unidos pelo destino: o marinheiro Seth, a princesa refugiada Gloria, o estudioso Elvis e a mercenária Adelle. O grupo fica completo logo nas primeiras duas horas do jogo, e logo parte em uma jornada para encontrar e coletar Asterisks – misteriosos artefatos que concedem poderes especiais a quem os carrega.

Exatamente como seu predecessor, Bravely Default II tem uma narrativa que começa exatamente como você espera – cristais elementais, intrigas na corte real, e por aí vai –, mas em um determinado momento chega em uma encruzilhada que destrói todas as expectativas. É um conto envolvente, carregado principalmente pela força de seus protagonistas e dos laços afetivos que eles constroem.

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Apesar de ser um RPG por turnos, Bravely Default II tem um sistema de combates cuja principal mecânica gira em torno do completo desrespeito perante o conceito de “esperar a sua vez para atacar.”

Isto não é novidade alguma para quem já jogou os títulos anteriores da série, mas vale a explicação: através dos comandos ‘Brave’ e ‘Default,’ jogadores podem até mesmo agir quatro vezes em um só turno. ‘Default’ faz um personagem assumir uma postura defensiva, acumulando um BP. Já o ‘Brave’ gasta tais BPs em troca do direito de realizar ações adicionais. É possível até mesmo alugar BPs, de maneira que o personagem fica devendo pontos na rodada seguinte e torna-se incapaz de agir até voltar a acumular um saldo positivo.

Diferente em Bravely Default II é a maneira como os times de heróis e inimigos não atuam como blocos, mas sim de maneira individual, o que traz ainda mais profundidade e variáveis ao planejamento de cada ação.

Ao quebrar os limites do sistema de turnos, a mecânica torna as batalhas mais dinâmicas e emocionantes. Será que você deve gastar todos os BPs para atacar com tudo de uma só vez, sob o risco de uma punição severa caso o inimigo não morra? Perguntas como essa surgem constantemente, principalmente no modo de dificuldade mais alto (que eu recomendo para todos os veteranos dos RPGs).

Mas a grande novidade de Bravely Default II, que o coloca à frente de seus predecessores, é o novo sistema de Jobs.

Uma das relíquias mais queridas da era de ouro de Final Fantasy, a mecânica de Jobs permite que o jogador altere as funções desempenhadas pelos personagens em batalha. Coletando Asterisks em Bravely Default II, o jogador ganha acesso a novos Jobs, cujas habilidades podem ser misturadas com uma liberdade nunca antes vista na série. Com tempo e criatividade, dá para criar um time de guerreiros monstruosos que fogem de qualquer estereótipo de como heróis de RPGs de fantasia devem lutar – e as descobertas continuam mesmo após os créditos finais da história.

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Enquanto o time criativo se preocupava em reinventar as mecânicas clássicas dos RPGs de turnos, porém, uma série de problemas mais mundanos acabaram passando despercebidos pelos desenvolvedores. Bravely Default II tropeça muito em aspectos básicos de apresentação, o que impede o jogo se cumprir todo o seu potencial.

Um exemplo rápido que ilustra bem o tipo de problema que permeia toda a experiência é o processo de encontrar dinheiro ao cortar grama. É uma atividade clássica, familiar a qualquer jogador de Zelda – e que, acima de tudo, é simples. Você realiza uma ação básica e é recompensado com alguns trocados. Só que Bravely Default II acha uma boa ideia interromper o movimento do herói, tocar um efeito sonoro e abrir uma caixa de texto contando as moedas toda santa vez que isso acontece. É algo que cansa bem rápido.

Seja por questões de orçamento ou mera falta de interesse dos desenvolvedores nesses detalhes da produção, o jogo parece confortável em se apoiar em sua origem nos portáteis como uma muleta – uma desculpa para questões como a cadência esquisita dos diálogos ou a lentidão exagerada dos menus. O problema é que Bravely Default II não é mais um mero RPG portátil descompromissado, e sim uma sequência para uma marca estabelecida que custa o mesmo que qualquer outro grande lançamento de Switch.

A coletânea de pequenos problemas não chega a anular o brilho das melhores ideias do jogo, mas certamente as ofuscam. O jogador acaba criando uma relação esquisita com a aventura, já que até mesmo os momentos de maior diversão vêm acompanhados por pitadas de leve irritação.

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A herança portátil de Bravely Default II também transparece em seu visual.

Ele não é um jogo feio: a mistura entre a estética ‘chibi’ dos personagens e a qualidade surpreendente das texturas faz com que o jogador sinta-se observando uma maquete em movimento. De maneira similar, o conflito entre o 3D dos heróis e o 2D das cidades desenhadas à mão cria cenas marcantes e agradáveis. O problema é que é muito mais fácil aproveitar tudo isso na telinha pequena do modo portátil do Switch. Quando é hora de exibir seus dotes na TV, Bravely Default II fica desengonçado, claramente fora de seu habitat natural.

As quedas na performance e os problemas causados pela baixa resolução são uma pena, pois ficam no caminho da excelente direção de arte do game. Mas o estilo de Bravely Default II se sobressai, auxiliado pela incrível trilha sonora na criação de uma atmosfera deste que parece ser um primo mais novo dos primeiros quatro ou cinco jogos Final Fantasy.

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Bravely Default II é um sucesso em muitos sentidos: ele inova perante seus predecessores, conta uma história instigante e esbanja estilo. Mas por ser atormentado por problemas técnicos e de execução, o jogo também decepciona ao desperdiçar a chance de ouro da série para subir de nível.

A existência de um lançamento assim em 2021 é uma vitória para qualquer fã de RPGs clássicos, mas não é um feito grande o suficiente para conquistar quem já não guarda esse tipo de jogo no coração.

  • Lançamento

    26.02.2021

  • Publicadora

    Nintendo, Square Enix

  • Desenvolvedora

    Claytechworks

  • Censura

    12 anos

  • Gênero

    RPG

  • Testado em

    Nintendo Switch

  • Plataformas

    Nintendo Switch

Nota do crítico