Negando um pedido da Advocacia-Geral da União (AGU) do governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o jogo de cartas Pokémon TCG está imune de impostos no Brasil.

A ministra Cármen Lúcia aceitou o argumento de que as cartas estimulam a leitura e por isso podem ser consideradas livros para fins de imunidade tributária. Atualmente, um pacote básico com 20 cartas custa R$15,00.

The Pokémon Company

O benefício fiscal está previsto no artigo 150 da Constituição Federal, que prevê isenção tributária com o objetivo de reduzir o preço final de livros, jornais e álbuns de figurinhas. A lei foi criada para reduzir o preço final de itens que podem estimular o acesso da população à cultura, à informação e à educação.

Apesar de uma carta Pokémon não ser um livro ou ainda uma figurinha adesiva, a ministra Cármen Lúcia concordou que a lei precisa ser lida de forma ampla e que as cartas podem sim estimular o público infantil a se familiarizar com meios de comunicação impressos. "Atendendo, em última análise, à finalidade do benefício tributário", assentiu a ministra.

A decisão foi publicada em abril do ano passado e pode abrir caminho para que outros jogos de cartas sejam isentos de impostos como livros no país.

Recentemente, o ministro da Economia, Paulo Guedes, ventilou a hipótese de acabar com a isenção de impostos para livros (via Gazeta do Povo). Caso prossiga com a ideia, o governo federal conseguirá taxar as cartas Pokémon.

GOVERNO FEDERAL X CARTAS POKÉMON

A disputa das cartas Pokémon e a Legislação Tributária no Brasil não é recente. Há mais de uma década, em 2009, a moeda foi lançada.

De um lado, o Centro da Indústria do Estado do Amazonas (Cieam) e a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN), órgão vinculado à AGU, questionavam na Justiça o benefício fiscal concedido à empresa Devir Livraria na venda do Pokémon TCG.

A Devir enquadrou o jogo como objeto educativo e por isso contava com a isenção de livros e jornais. Analisando a questão durante anos, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) deu ganho de causa para Pokémon e negou a aplicação dos impostos a mais, pedidos pelos entes federativos.

Mas o governo federal ainda tinha algumas cartas prêmio nessa disputa.

Em 2020, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, como quem usa uma carta de treinador, levou a discussão para o STF, a maior instância de Justiça do país. A PGFN entrou com um Recurso Extraordinário com Agravo (ARE), pedindo que o STF suspendesse a decisão do TRF3 e permitisse a aplicação dos impostos até que a questão fosse decidida de uma vez por todas.

Foi então que o inusitado aconteceu. A definição do que são as cartas Pokémon e o pedido do governo parou na mesa da ministra Carmém Lúcia, que teve que se debruçar sobre o jogo.

Agência Brasil / Montagem

O governo federal argumentava que a análise do TRF em equiparar Pokémon a livros ou a um álbum de figurinhas para isenção fiscal era superficial. Primeiro que o TCG era um jogo de estratégia. Depois, o mais óbvio, as cartas de Pokémon não eram adesivas para serem entendidas como figurinhas.

"A regra da imunidade prevista no texto constitucional visa estimular o avanço da cultura, da democracia, da educação, do acesso à informação e um jogo do Pokémon seguramente não serve a essa finalidade", argumentou o governo federal.

A PGFN estava convencida de que as cartas não estimulavam a leitura — apenas complementavam um jogo de conquista e trocas, elemento tributado pela Receita Federal na classificação de "cartas de jogar".

O STF não aceitou os argumentos. Contou a favor de Pokémon TCG o fato de o jogo possuir conteúdo interativo e personagens retirados dos mangás, descritos pela defesa como "livros ilustrados".

O entendimento foi além. A ministra da Suprema Corte aceitou que Pokémon TCG estimula a procura por conhecimento e enquadrou uma carta como um veículo de transmissão de informação impresso para o público infantil.

Com os argumentos na mesa, Pokémon TCG foi incluído no conceito de livros e periódicos da regra tributária imunizante.

O STF negou o AGE e ainda determinou que o governo federal pague 10% dos honorários advocatícios. O caso voltou para o TRF3, onde ainda pode ser revisto, mas agora com um golpe super efetivo vindo de uma instância superior.