O cenário feminino internacional de Counter-Strike: Global Offensive (CS:GO) pode estar perto do fim. Ao menos é o que Vilga, capitã da Galaxy Racers, teme. A jogadora já foi campeã mundial na modalidade feminina por diversas vezes no passado, enquanto atualmente vê o cenário das mulheres se desfazer aos poucos.

De acordo com ela, o fim do cenário feminino de CS:GO pode acontecer por conta da falta de apoio. Os torneios femininos estão cada vez mais escassos e, a Valve, que é dona do game, não tem absolutamente nenhuma iniciativa para as mulheres.

Na contramão da própria Valve está a Riot Games, que criou circuitos femininos lotados de campeonatos em várias regiões do mundo. Todo mês a empresa apoia monetariamente ao menos uma competição feminina em cada região, ao mesmo tempo que organiza qualificatórias e duas grandes competições nacionais no ano. Somente no Brasil o circuito feminino terá um apoio monetário da Riot de R$ 460 mil ao longo de 2021, com o valor inteiro sendo destinado para premiação. Fora o tempo, estrutura e dinheiro dedicados para a organização de torneios.

Por conta deste grande apoio da Riot, muitas equipes femininas internacionais de CS:GO estão migrando de jogo. Até mesmo jogadoras com uma vasta história vencedora no Counter-Strike estão indo para o VALORANT, pois enxergam um mundo de possibilidades infinitamente maior.

Vilga comentou sobre isso no tuíte abaixo:

Enquanto Klaudia, ex-jogadora de CS:GO e atualmente de VALORANT, comemora que já jogou sete campeonatos com sua equipe desde maio, Vilga lamenta pelo mesmo não acontecer, nem de perto, no Counter-Strike.

"É muito louco como a cena feminina do CS:GO literalmente não tem grandes torneios ou quase nenhum torneio. Veja a Riot e compare com a Valve. Não me admira que todas tenham partido para o VALORANT. Se continuar assim, veremos 0 times femininos de CS:GO no futuro."

Assim que fez este tuíte, Vilga recebeu vários comentários atacando a cena feminina, os quais afirmavam que a cena é inútil e não deve existir. Este mesmo comentário também são recorrentes no Brasil em absolutamente todos os conteúdos produzidos a respeito da cena feminina. Isso levou a jogadora a fazer um texto maior, explicando porque existe cenário feminino nos esports e qual a importância dele.

"Razões pelas quais a cena feminina precisa de torneios separados (minhas opiniões e de outras pessoas)

Se compararmos a quantidade de jogadoras com a quantidade de jogadores masculinos, veremos uma grande diferença - Por isso é mais difícil encontrar uma mulher que tem como objetivo competir no nível mais alto possível.

A comunidade é muito sexista e tóxica para todas as garotas que começam a jogar. A cada jogo, a cada pug que entramos e falamos qualquer coisa, alguém responde de forma grosseira na maioria das vezes. Nós mulheres só temos a segurança de jogar o jogo de forma adequada e melhorar nele se estivermos com pessoas conhecidas. É preciso ter muita força para ignorar todo esse ódio que recebemos e manter nossa mente focada no nosso sonho.

Quando temos torneios [femininos], temos competitividade, chances de ganhar uma premiação e um espaço seguro onde podemos encontrar pessoas com os mesmos objetivos.

Quem me conhece sabe o quanto sou apaixonada por competir contra profissionais do sexo masculino no mesmo nível e mostrar ao mundo que as meninas podem vencer em qualquer jogo e muito mais. Por isso tenho como objetivo jogar eliminatórias e ligas abertas. Eu provo isso com minhas ações. Mas sempre foi difícil encontrar meninas tão apaixonadas por esse mesmo objetivo - outro motivo pelo qual precisamos de mais jogadoras.

Este tópico é muito mais profundo do que muitas pessoas conseguem enxergar. Há vários ignorantes que não conseguem ver as coisas pela nossa perspectiva. Os fatores pra isso acontecer são muitos - o modo de pensar, o preconceito da sociedade, até mesmo o quão diferente muitos pais criam meninos e meninas e como a maioria das meninas brinca de boneca e bola de menino.

O jogo existe há 20 anos e nunca vimos uma equipe feminina Tier 1 ou mesmo uma jogadora. Os times masculinos (com raras exceções) não tem nenhuma garota sob sua tutela, não importa o quão boa ela seja.

No geral, a razão pela qual precisamos de torneios [femininos] é o que @dymguid disse: 'É uma discriminação reversa padrão (não lembro se o termo era exatamente esse). A ideia é que o cenário feminino exista até resolvermos estes problemas. Até que não seja necessário mais'.

O Valorant é o exemplo perfeito disso. As melhores equipes femininas de CS:GO estão indo para este jogo e, se nada mudar no CS:GO, nossa cena morrerá."

É verdade que não há diferenças biológicas que impeçam homens e mulheres de competirem juntos nos esports, ao contrário do futebol e da luta, por exemplo. A existência do cenário feminino nos esports, no entanto, não tem a ver com Biologia e sim Sociologia, como evidenciou Vilga. A cena feminina existe por conta do preconceito que ainda existe com a mulher e a forma como elas são tratadas por conta disso. Não é necessário mais do que cinco segundos de pesquisa na internet para encontrarmos milhares de vídeos de mulheres sendo atacadas em jogos on line somente por serem mulheres.

É por isso que é tão preocupante pensarmos que o cenário feminino, o único local em que mulheres se sentem seguras para jogar e competir, possa simplesmente acabar pois não há apoio. Curiosamente, ao menos no Brasil o cenário feminino tem mostrado evolução e e grandes campeonatos como é o caso da Grrrls League, Gamers Club Masters e mais. Ainda assim, não se trata de uma estrutura sólida o bastante que não gere preocupações como a da própria Vilga.

São muitas as cobranças em cima da Valve para que ela seja mais ativa no competitivo. Olhando o histórico da empresa diante de todos estes questionamentos e pedidos, infelizmente, é provável que o ponto do fim do cenário feminino seja somente mais um entre tantos outros sumariamente ignorados.