Gabriel “FalleN“ Toledo é um dos nomes mais fortes no cenário nacional de Counter-Strike. O jogador hoje atua como capitão da Luminosity Gaming, organização norte-americana cuja lineup do FPS é composta inteiramente de brasileiros e que ultimamente tem se posicionado entre os melhores times de CS:GO do mundo.

None

Antes de ser reconhecido internacionalmente por sua habilidade no jogo, FalleN já foi peça fundamental no renascimento do Counter-Strike no Brasil com a criação do projeto da Games Academy. A iniciativa inclui aulas do game para iniciantes, campeonatos pontuais para os interessados e também auxilia diversas equipes em vários aspectos - como mandar uma lineup inteira para os Estados Unidos em um bootcamp.

Inclusive, o time argentino No Tenemos Nada veio disputar o MAX5 Invitational CS:GO em São Paulo graças à ajuda da Games Academy, GamersClub e de Gabriel: “Eu só retribuí o favor que já fizeram um dia por mim. Eu penso muito nisso e gosto de ter essa troca e fazer o bem aos outros. Quando fiquei sabendo que eles queriam vir e não tinham grana, nós compramos a passagem de volta para eles e falei que eles não precisariam gastar com hotel, que poderiam ficar na minha casa”.

A ideia do projeto da Games Academy com Gabriel começou no final de 2010, no declínio do CS 1.6, para aquecer um cenário que morria aos poucos. “Já era um momento de decadência para o CS, não só no Brasil como lá fora também: os campeonatos já estavam caindo de qualidade e alguns dos grandes jogadores deixaram de jogar, o cenário começou a esfriar. O que foi feito para o pessoal entender melhor o jogo se tornou algo maior, eu tive que começar a fazer campeonatos e manter a comunidade dinâmica”, diz o capitão da Luminosity Gaming.

A ação realmente manteve o ecossistema nacional do jogo funcionando até o CS:GO se estabilizar internacionalmente no lugar do 1.6 e finalmente também contagiar o Brasil. “Muitas pessoas me falam ‘FalleN, se não fosse você ou a Games Academy, eu não estaria jogando’. De certo modo isso é verdade, não dá para saber como estaria sem o projeto, talvez o jogo agora estivesse tão decadente no Brasil que nem existiria esse tumulto para jogar. Lá fora estaria estourando e nada aqui no país, essa é a parte legal do projeto”, comenta.

Mesmo com um cenário nacional inteiro sendo reconstruído, a perspectiva de Gabriel sobre o nível de habilidade entre o cenário brasileiro e internacional do FPS ainda é positiva. “Muitos jogadores brasileiros permaneceram em atividade nos últimos anos, conseguindo manter o nível. Essa galera já tem um potencial, teve uma oportunidade para continuar evoluindo. Esses nomes que retornaram ao cenário agora sabem como jogar”.

Antigas lendas como Vito "Kng" Giuseppe, Renato “nak” Nakano e Bruno "bit" Lima estão nessa lista de FalleN. “Eu fiquei muito feliz quando eles voltaram. Foram ídolos em uma época sem muito prestígio, eles tiveram grandes conquistas de 2003 a 2010. Um time brasileiro até conseguiu título de mundial, mas não existia metade da dimensão que existe hoje”, lembra o cyberatleta.

A realidade era muito diferente da atual. No passado, era necessário se conectar ao jogo para assistir a uma partida competitiva. Hoje, além dos campeonatos oferecerem transmissões de alta qualidade com narradores e comentaristas, os jogadores são tratados como celebridades pelos fãs.

None

Esse cenário atual é propenso a atrair antigos nomes que deixaram o jogo para se dedicar aos estudos ou trabalho. Mesmo assim, nem todos alcançarão seu objetivo, segundo Gabriel. “Nesse momento eu só acho que eles estão abaixo do potencial, alguns inclusive não vão conseguir voltar a jogar. Quem sabe o cenário alimente a vontade deles e dê condições para eles focarem no jogo e assim voltarem à ativa”, comenta.

A questão da preferência de equipes brasileiras para veteranos é compreensível para FalleN: “As grandes organizações precisavam desses nomes para investir e voltar ao cenário com o retorno esperado”, diz. Muitas vezes, a comunidade aponta que os novatos acabam no limbo por esse favoritismo, mesmo possuindo destreza o suficiente para se assegurar no cenário competitivo.

O jogador discorda: “É muito simples: se existem jogadores melhores do que esses, que montem um time e ganhem deles. O pessoal que começa a jogar agora acha realmente que existe uma panela, mas é oportunidade. Eles precisam aparecer, criar um time com pessoas que também não são conhecidas e não possuem espaço nessas equipes e chegar lá e ganhar dos caras”.

Ele faz a comparação: “No final das contas, jogar Counter-Strike é igual andar de bicicleta. Os conceitos ensinados no passado também podem ser usados nesse jogo. A experiência, a movimentação e as decisões; tudo isso você não perde e não é qualquer um que possui”.

Quando questionado sobre a consolidação do cenário brasileiro e a necessidade das organizações mandarem seus times de CS:GO para fora, Gabriel fica dividido: “Essa é uma pergunta bem difícil, eu tive já que pensar muito nisso quando eu mandei a segunda melhor equipe do Brasil, a Games Academy, para fora”.

8 fotos

1 de 8
+3 fotos
✖︎

O que me fez levá-los foi saber que eles tinham qualidade e estavam em um cenário que não os comportava. Pensei comigo ‘porque eu estou tendo essa condição e esses caras que tem o mesmo nível estão lá sofrendo?’. Mas isso mudou um pouco agora, o cenário está em transformação. Hoje eu avaliaria diferente, já vale a pena pensar em uma consolidação do cenário”.

Ele confessa: “Sendo bem sincero, eu não sei se quero ficar para sempre lá fora. Temos família, namorada. É lógico que nesse momento a gente vale muito mais fora do que aqui, é uma questão profissional: você não vai deixar de ganhar dinheiro e torneios porque você quer ficar em casa. Temos que deixar isso de lado um pouquinho, mas quem sabe daqui a um ou dois anos a gente não possa ter esse retorno da galera que foi pra fora”.

Fotos: Branca Galdino

É bom estarmos fora do país, porque considero nosso nível um pouco acima dos outros. Aqui no Brasil vai ficar muito acirrado, os times não vão saber quem é o melhor e vão brigar por esse posto, assim em pouco tempo chegar ao nosso grau”, analisa.

Esse é um dos maiores motivos de tanto investimento no cenário brasileiro - além do desejo de levar o Brasil novamente ao topo do mundo, como um dia já aconteceu com o MIBR, campeão mundial de CS em 2006. A Luminosity Gaming está a poucos passos de tornar isso possível, realizando boas performances em torneios internacionais e vencendo de grandes times consolidados mundialmente no jogo.

Essa é nossa meta nesse momento, vamos fazer o máximo que pudermos para trazer isso. Vamos continuar treinando bastante com essa paixão que temos e acho que conseguiremos isso em 2016. Terminamos 2015 muito bem, como a sexta melhor equipe do mundo, sendo que antes ninguém lá fora conhecia a gente”, o jogador diz, otimista.

Mas nem tudo na carreira de FalleN foram flores. O cyberatleta já passou por diversos momentos difíceis. Desde dificuldades financeiras até decisões árduas, uma das passagens que mais marcou a vida do capitão foi enquanto ele ainda jogava pela KaBuM, no começo de 2015. O time havia sido convidado a participar da liga de eSports MLG, nos Estados Unidos.

A gente não tinha condições na época, nosso time guardava o salário - que era bem baixo comparado a hoje em dia - para nos resguardar quando aparecesse alguma oportunidade de viajar. Fomos para a MLG e usamos o dinheiro para participar de um outro campeonato que não era muito grande, mas aproveitamos porque estávamos nos Estados Unidos”, recorda.

A equipe teve um bom desempenho nos torneios e por isso, para surpresa de todos, os jogadores receberam um convite para jogar as qualificatórias do Major. Gabriel comenta: “Estávamos com a passagem de volta comprada, dali a dois dias, e a gente naquela situação. Foi uma corrida atrás de patrocinador, de alguém que pudesse ajudar. Não tinha como tirar do bolso, o próprio patrocinador não tinha aprovado a ideia, então a gente teve que sentar no hotel e pensar no que faríamos”.

Lembro de olhar para os jogadores e o Fernando [Fernando "fer" Alvarenga] foi muito importante nesse dia.”, continuou. “Ele falou que se a gente não fosse jogar, ele pararia porque não faria sentido nos esforçarmos tanto para deixar uma oportunidade dessas ir embora.

Dessa maneira, os jogadores decidiram nesse dia que abririam uma campanha de financiamento de R$ 25 mil, valor necessário para participarem do campeonato. “Lógico que era muita grana, mas se parar pra pensar é um país inteiro que gosta de você, que sonha junto em buscar um título. Esse dia foi muito marcante para mim e poderia ter tomado um rumo muito diferente. Em 7 ou 10 dias, conseguimos arrecadar esse valor. A comunidade foi essencial dando esse pontapé inicial para fazermos isso”.

Por isso o jogador hoje ajuda todos do cenário que precisam: “Nessa parte financeira, o que a gente puder ajudar através do projeto que temos, nós vamos fazer. Tentamos impulsionar mesmo não tendo nada a ver com a gente. Torcemos para que eles se acertem aqui, não dá para ficar levando para fora do país porque é caro”.

Gabriel finaliza: “Tem que existir um cenário bacana aqui, agora com a MAX5 que é um lugar bacana, já tem aonde fazer as coisas de uma maneira profissional. Acho que está tudo indo para um caminho certo para que os times não sofram tanto”.