A vida é feita de altos e baixos, e com KBR não é diferente. Pela primeira vez em quase quatro anos de carreira no Fortnite, o jogador da organização norte-americana Team 33 conquistou a Fortnite Champion Series (FNCS) ao lado de xeat. Antes disso, o pro player de 19 anos precisou lidar com dificuldades financeiras dentro de casa e passou por decepções e frustrações competitivas dentro do battle royale da Epic Games, além de ter sido um dos afetados pela forte chuva que atingiu Petrópolis, cidade do Estado do Rio de Janeiro, em fevereiro deste ano.

Em entrevista exclusiva ao The Enemy, KBR deu detalhes do primeiro contato com os games e do início no Fortnite. Além disso, o jogador também falou de como foi o apoio da família, a passagem pela Team Vikings e o sentimento de vencer a FNCS depois de tudo que passou. 

LEIA MAIS

fortnite battle royale epic games fortnite champion series fncs T1C3 temporada 2 capítulo 3 fortnite fncs finais kbr petrópolis tragédia
KBR, atual campeão da FNCS (Foto: Reprodução/Twitter)

Relação com os games

KBR foi mais um influenciado pelo fenômeno das lan houses, mas nunca deixou de aproveitar a infância das ruas. O primeiro contato dele com os games foi a partir de um local com computadores que existia perto da sua casa, em Petrópolis. Lá, o menino de oito anos, ainda conhecido como Kaique, descobriu o GTA e passou a jogar até mesmo escondido dos pais.

“Quando eu era pequeno gostava de jogar em computador, mas somente em lan house. Costumava jogar apenas GTA com o pessoal da minha rua. Eu ia até escondido porque meus pais não gostavam que eu jogasse GTA. Só que eu sempre fui mais de brincar na rua e nunca fui muito de ficar em casa não. Brincava de tudo, desde montar carrinho de rolimã até pique-esconde na rua”, contou.

Apesar da preferência por PC, o primeiro eletrônico que KBR ganhou foi um celular, quando tinha entre 11 e 12 anos. A partir do dispositivo móvel que começou a jogar Clash of Clans e Clash Royale. No último, ele conta que obteve sucesso, chegou a ganhar o próprio dinheiro e participou de um time famoso na época - que acabou sendo mandado embora após se envolver em uma polêmica na comunidade.

“No meu sétimo ano de escola, eu ganhei um celular dos meus pais e passei a jogar Clash of Clans e Clash Royale. Jogava tanto que fiquei bom no Clash Royale e cheguei a estar no top 600 global sem colocar dinheiro no jogo. Foi lá que eu ganhei meu primeiro dinheiro: 400 reais de um brasileiro que pediu para que eu subisse a conta dele de ranque”.

“Fiz parte do time da youtuber CajuTV de Clash Royale, mas acabei fazendo uma m**** quando era desse time porque eu liguei para um cara, que estava participando do Mundial do jogo, e fiz com que ele fosse desconectado da partida. Aí ele divulgou meu número na época e eu precisei trocar [de número] porque travou meu celular. Acabou que eu saí do time por conta disso”, revelou.

“As pessoas podem tentar de tudo, mas não vão conseguir me abalar. Se eu me abalar vai ser por conta própria e não pelos outros”

Contato com o Fortnite

O lançamento do Fortnite em 2017 foi de encontro ao desinteresse de KBR pelo Clash Royale. O único problema era que o jogador não tinha um computador e vivia problemas financeiros dentro de casa. Mesmo assim, os pais dele fizeram um esforço quando viram que se tornou uma demanda necessária para que KBR estudasse. Mal sabiam eles que aquele notebook seria a porta de entrada para um novo universo.  

“Quando desanimei um pouco do Clash Royale, ganhei um notebook do meu pai porque estava precisando de um computador para estudar. Eu sempre tive dificuldade para ter as coisas, mas meu pai conseguiu uma venda mensal boa na loja de material de construção dele e pôde me dar o notebook junto com a minha mãe”, disse.

fortnite battle royale epic games fortnite champion series fncs T1C3 temporada 2 capítulo 3 fortnite fncs finais kbr petrópolis tragédia
KBR com seu primeiro notebook (Foto: Arquivo pessoal)

Curiosamente, quem apresentou o Fortnite para KBR foi o youtuber Flakes Power, hoje também fundador da Hero Base. O jogo foi o contato inicial do pro player, de 14 anos naquela época, com o gênero battle royale. A paixão, obviamente, foi à primeira vista.

“Na época, o Fortnite estava começando a estourar. Aí eu vi vídeos do Flakes [Power] jogando o jogo e baixei. O notebook não era dos melhores, mas eu conseguia jogar. Foi meu primeiro contato com battle royale. O máximo que eu cheguei perto de ter contato com um tipo de jogo similar foi com CS 1.6, que eu assistia o pessoal jogar na lan house”, confessou.

Início no competitivo e apoio da família

A entrada de KBR no competitivo do Fortnite foi natural até o momento em que houve o anúncio da Copa do Mundo do jogo, em 2019. Fui jogando, jogando, jogando e melhorando. Joguei a primeira semana da Copa do Mundo e fiquei no 504º lugar, sendo que os 500 primeiros ganhavam US$ 100. Só na terceira semana que eu consegui ficar entre os 250 melhores e ganhei US$ 250”, disse.

Ganhando dinheiro com jogo online aos 15 anos, KBR chamou a atenção da família, que precisou de tempo para entender a situação. Quando entendeu, não houve falta de apoio. Pelo contrário, os familiares proporcionaram o primeiro computador para que ele pudesse rodar Fortnite em um nível bom.

“Comigo foi igual a todo mundo. Ninguém acredita, mas não teve uma reação muito grande. Meus pais sempre ficaram muito felizes quando entenderam que eu não estava fazendo nada e estava ganhando dinheiro. Eu falava com meu pai que eu estava melhorando no Fortnite, mas que não conseguia ir tão bem por conta das limitações da configuração do notebook. Não tinha como meu pai me dar um PC gamer porque é caro. Só que um primo meu, que é jogador de poker profissional e praticamente foi criado pelo meu pai, me deu um PC gamer. Tudo mudou depois disso”, falou KBR.

Passagem pela Team Vikings

Com boas colocações nos campeonatos, KBR atraiu interesse da Team Vikings, organização que surgia forte no cenário de Fortnite e que fez uma proposta para contratá-lo. Embora não tivesse noção de valores e exigências contratuais na época, o jogador topou assinar com os Vikings em abril de 2020, mas deixou a organização no fim daquele ano.

“Um dia depois que eu e Seeyun terminamos na 3ª posição da FNCS, a gente entrou na Team Vikings com contratos de seis meses. Na época, a gente não sabia valores de salário para pedir. Eles [Team Vikings] também eram novos no Fortnite. Fiquei na 8ª colocação de uma FNCS quando estava na Vikings e depois eu saí por decisão da organização, mas acho que eu não estava indo bem nos campeonatos e também não estava fazendo live”, opinou.

Frustração como oportunidade de crescimento

Após deixar a Team Vikings, KBR melhorou suas performances e teve resultados bem consistentes na FNCS. Tanto é verdade que, em todas as finais da competição, nunca ficou de fora dos dez mais bem colocados. Mas sempre faltou aquele algo a mais para chegar ao título. Antes faltava mais dedicação minha. Eu já me dedicava, mas faltava mais”, disse. 

“Hoje em dia eu cheguei a um patamar que eu já sei muito sobre o Fortnite. E mesmo sabendo de tudo, ainda cometo um erro bobo que custa a partida. No fim de 2021 era a época que eu mais me dedicava ao jogo, mais até do que hoje. Aí que eu aprendi sobre o jogo, entendi como poderia ir bem nos campeonatos e foi isso. Valeu como aprendizado”, completou.

fortnite battle royale epic games fortnite champion series fncs T1C3 temporada 2 capítulo 3 fortnite fncs finais kbr petrópolis tragédia
Foto: Divulgação/Team Vikings

Só que antes de evoluir como jogador, KBR precisou lidar com a decepção, algo que não foi fácil. O pro player revelou que pensou em parar de jogar quando não conseguiu se classificar às finais da FNCS da Temporada 6 do Capítulo 2 do Fortnite e que se sentiu frustrado ao não ser capaz de transformar a dedicação em resultados.

“Quando não passei para as finais, eu fiquei muito mal. Foi quando eu estava começando a me dedicar muito no jogo e eu pensei em parar de jogar. Fiquei muito desanimado. Por mais que eu ia bem antes disso, pensei: “Será que isso é pra mim mesmo?”. Essa época foi muito ruim, mas continuei jogando porque queria provar para mim mesmo que eu conseguia. Quando eu passei para as finais na temporada seguinte, eu fiquei muito feliz e cheguei a chorar”, confessou.

“Se eu for enfrentar algum pro player do exterior, acho que vou bater de frente”

Estragos causados pelas chuvas

Morador de Petrópolis desde a infância, KBR vivenciou a forte chuva que atingiu o município e provocou enchentes, uma série de deslizamentos de terra e mais de 240 mortes em fevereiro de 2022. Ele teve a casa alagada, perdeu móveis, eletrodomésticos, alimentos e roupas que possuía, mas não se abalou: seguiu focado na disputa da primeira FNCS deste ano.

As pessoas podem tentar de tudo, mas não vão conseguir me abalar. Se eu me abalar vai ser por conta própria e não pelos outros. Então, sabia que não podia deixar de fazer o meu trabalho, mas as duas primeiras semanas após os estragos foram muito ruins"

“Por mais que eu não tenha sido a pessoa que mais sofreu na tragédia, eu tinha que tentar ajudar de alguma forma aqui dentro de casa. Só continuei focado porque ir bem na FNCS era algo que seria bom para dentro de casa. Não podia virar as costas para uma coisa que, querendo ou não, é o meu trabalho. E eu sabia que tinha capacidade de ir bem. Eu realmente não podia abandonar”, contou KBR.

As perdas materiais não serviram de motivação para que KBR buscasse ainda mais o título da FNCS. Sem pensar nisso, o jogador quer ser visto com outros olhos. "Eu não quero que as pessoas fiquem com pena de mim. Eu tenho que ganhar porque sou bom e não porque passei por esse tipo de situação. Não queria usar aquilo [estragos na casa em Petrópolis] para me vitimizar em cima. Queria ir bem pela minha dedicação”, afirmou.

FNCS e o topo do mundo

Alívio: assim KBR define o sentimento de conquistar a FNCS. Depois de estar próximo do título em pelo menos quatro diferentes edições do torneio, o jogador enfim conseguiu chegar ao topo do Brasil. O resultado não caiu do céu e foi fruto de muito trabalho e dedicação ao longo dos anos.

Tudo que eu fiz realmente valeu a pena, porque sempre fui muito dedicado no que eu faço. Foi um alívio também. Sempre bati na trave e sempre tive resultados bons em todas as FNCS que passei para as finais, mas nunca tinha conseguido ser campeão. É um negócio muito gratificante depois que você se dedica e ganha”, disse.

Se antes não foi possível, como agora KBR se tornou campeão da FNCS? Para ele, a mudança na rotina fora de jogo foi determinante, já que passou a ficar menos tempo no PC e soube controlar melhor seu tempo no dia a dia. O jogador também acredita estar mais maduro profissionalmente.

“Tudo que eu passei valeu a pena para eu me tornar aquilo que eu sou hoje. Eu achava que só se eu jogasse o jogo ia ser bom naturalmente, mas o negócio é ser dedicado por completo. A mudança na minha rotina fora de jogo foi o maior diferencial. Posso ficar sem entrar no PC por muito tempo, mas quando entrar eu vou pegar para realmente me dedicar. É uma hora importante para mim”, revelou.

Em entrevista ao ge, em abril de 2020, KBR expôs planos de estar entre os melhores jogadores de Fortnite do mundo. Hoje, com o título da FNCS e mais maduro, ele considera ter atingido o objetivo.

“Eu me considero um dos melhores jogadores do mundo. Se eu enfrentar algum pro player do exterior, acho que vou bater de frente. A inspiração nos gringos foi tanta que eu acho que cheguei em uma capacidade que posso estar melhor do que eles. Hoje em dia eu sei me virar em qualquer situação do jogo”, concluiu KBR.