Desenvolvedores indies brasileiros se formam em programa de aceleração do Google

Classe de 2019 do programa contou com quatro representantes do Brasil

Por Rafael Romer 12.12.2019 19H30

Quatro desenvolvedores de jogos independentes brasileiros se formaram na madrugada desta quinta-feira (12) no programa do Google de aceleração para estúdios Indie Games Accelerator 2019. A turma deste ano foi a primeira a contar com a participação de estúdios da América Latina, incluindo também produtoras mobile da Argentina, Uruguai, Paraguai e Colômbia.

No total, 30 estúdios participaram da cerimônia de formatura em Singapura, que marcou o fim de um processo de mais de seis meses com estúdios selecionados da América Latina, Oriente Médio e Sudeste Asiático, onde todos experimentaram uma imersão e mentoria para auxiliar na organização de suas empresas e no desenvolvimento de seus jogos.

Entre os estúdios brasileiros que participaram do programa neste ano estão a MonoMyto, Orube Game Studio, Pixodust e Webcore Games.

Segunda Vineet Tanwar, gerente de desenvolvimento de negócios da Google Play, a criação do programa veio da experiência do Google com outros projetos de incentivo a produtores independentes da empresa, incluindo o Indie Corner – iniciativa que dá destaque para jogos indies dentro da loja de apps do Android.

O que nós aprendemos com a iniciativa Indie Corner é que todos os desenvolvedores estão tentando criar jogos divertidos”, explicou Tanwar, gerente de desenvolvimento de negócios da Google Play. “Ainda assim, há o aspecto de negócios [destes estúdios]”.

Rafael Romer/The Enemy

A partir da ideia de formatar um programa para ajudar estúdios a se organizarem do ponto de vista de negócios, incluindo tarefas como organização empresarial, gerenciamento de pessoas e monetização dos jogos, a empresa deu início então ao programa no ano passado. Antes focado apenas em produtoras do Sudeste Asiático, o programa passou a incluir o Oriente Médio e a América Latina neste ano – esta última, com uma população gamer estimada em 252 milhões, segundo dados apresentados pela empresa.

O processo para a inscrição de estúdios no Indie Games Accelerator começou em abril deste ano e recebeu mais de 1,7 mil inscrições de produtores independente interessados. Um time de 18 Googlers fez um “pente fino” nos estúdios, escolhendo os 30 mais promissores e deixando de fora produtoras cujos jogos estavam em alfa ou não tinham uma versão jogável de fato.

Entre julho e agosto, os estúdios participaram de um Bootcamp em Singapura, onde passaram por uma série de sessões de mentoria com especialistas da própria empresa e veterano da indústria, incluindo nomes como Wan Hazmer Bin Wan Ab Halim, líder de desenvolvimento Final Fantasy XV, e Steven Meretzky, um dos responsáveis pelo jogo de aventura The Hitchhiker's Guide to the Galaxy, lançado em 1984, pela Infocom.

O currículo do programa inclui aspectos como o próprio desenvolvimento de jogos, crescimento e desenvolvimento de negócios, monetização, metodologias de suporte e atualização de games e, é claro, de liderança.

Segundo Sami Kizilbash, responsável pelas relações com desenvolvedores do programa Indie Games Accelerator, o processo também se baseia na elaboração de OKRs (Objectives and Key Results), uma metodologia que ajudou estúdios a estabelecerem suas prioridades ao longo do processo.

Estúdios de games são uma indústria única, que requer uma aproximação customizada de aceleração”, afirmou. “Eles não são startups padrão, eles não empresas de tecnologia padrões, é preciso de um currículo que evoluiu ao longo dos anos, como desenvolver melhores práticas, os tipos de ferramentas que têm à disposição, os tipos de metodologia e conceitos de design que podem usar”.

Para Camila Malaman, diretora do estúdio brasileiro Webcore Games, o maior aprendizado do programa foi separar a “cabeça do console” do estúdio, que tem jogos publicados para o PlayStation 4, do desenvolvimento mobile, que tem características e processos próprios.

Rafael Romer/The Enemy

O maior aprendizado foi separar bem, uma coisa é o console, outra coisa é mobile, você tem que pensar diferente. São pessoas diferentes que vão trabalhar nisso, o mercado é diferente, o negócio é diferente. Isso foi o maior aprendizado”, explicou.

Já para Francisco Lara Sikorski, do estúdio mexicano 1 Simple Game, a organização interna das próprias desenvolvedoras foi uma das lições mais importantes do programa, já que os estúdios latino-americanos que participaram do processo não tinham estruturas empresariais tão organizadas quando chegaram ao projeto de aceleração.

Nós latino americanos não estamos tão estruturados como outros países, e isso é algo necessário na indústria dos games”, comentou. “Na indústria dos games, estrutura e processos são muito importantes, quando você faz um projeto de paixão, você faz algo que acredita que vai funcionar, mas quando vê isso como um negócio, você precisa seguir regras, colocar deadlines, ver o que o mercado quer. Isso é difícil”.

A observação é ecoada por Juan de Urraza, CEO da desenvolvedora paraguaia Posibillian Tech, que ressaltou a importância do aprendizado de que os estúdios devem pensar como empresas para garantir a sua sobrevivência e a do seus games.

Eu acho que a maioria dos desenvolvedores indies querem fazer projetos de paixão e não pensam muito mais nisso”, afirmou. “Eles não estão pensando como uma companhia, se o projeto terá lucro, se vai funcionar, se pessoas estarão interessadas. É ok fazer isso na sua universidade ou faculdade, mas se você quiser viver desenvolvendo videogames, você precisa pensar como um negócio”.

Com o término do programa de aceleração, os 30 estúdios voltarão para seus países de origem onde continuarão o desenvolvimento de seus projetos. Durante a cerimônia, Kizilbash fez apenas dois pedidos aos desenvolvedores: que mantenham o contato uns com os outros para o intercâmbio de ideias e que ajam em suas comunidades para distribuir os conhecimentos obtidos ao longo do programa.

Questionado pelo The Enemy, Kizilbash afirmou que o desejo do programa é sempre expandir o seu escopo e trazer mais desenvolvedores, mas ainda não confirmou se a América Latina fará parte da próxima turma do Indie Games Accelerator.

Assim como este ano, as inscrições para o programa do ano que vem serão abertas em abril, mas já é possível realizar um pré-cadastro através da página do projeto para ficar por dentro das novidades da turma de 2020.

*o repórter viajou à Singapura a convite do Google