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Preconceito com folclore foi maior anos atrás, diz autor do "Witcher brasileiro"

A Bandeira do Elefante e da Arara ganhou fama internacional ao explorar lendas do Brasil colonial

Por Pablo Raphael 06.12.2019 14H36

"Não faz isso aí, não vai dar certo, folclore é muito infantil".Esses eram os típicos comentários que Christopher Kastensmith, criador de A Bandeira do Elefante e da Arara, ouvia uma década atrás, quando começou a elaborar a ideia de criar um cenário de fantasia baseado no Brasil e nas lendas do período colonial.

Christopher não concordava. "Folclore não é infantil, é infantilizado. Essas lendas são histórias de terror", comenta o autor em entrevista ao The Enemy na CCXP19. O receio de que sua obra tivesse uma recepção ruim fez com que ele lançasse o projeto primeiro fora do Brasil. "Seria algo diferente, desconhecido para quem não é daqui."

A estratégia deu certo: em 2011, o primeiro conto de A Bandeira do Elefante e da Arara concorreu ao Nebula, um dos principais prêmios do gênero de fantasia do mundo.

Transmídia

Ex-diretor criativo da Ubisoft, o autor, que trabalhou nos jogos da linha Imagine, teve contato na produtora francesa com os conceitos de transmídia e implementou a ideia no mundo da Bandeira. "Além dos contos, vieram quadrinhos e o RPG de mesa", diz Christopher, que tem a jogatina como hobby desde a infância.

O RPG demorou a sair, sendo lançado em 2017 pela Devir. O jogo de A Bandeira do Elefante e do Macaco foi publicado em português e inglês e foi o primeiro título brasileiro a ganhar o Ennie, maior premiação do RPG.

A repercussão internacional só aumentou desde então: A Bandeira vai ganhar versões em espanhol e em 2020, será lançado em chinês.

Christopher Kastensmith

Mas é no Brasil que o RPG da Bandeira tem seu público mais ativo. "São 1500 jogadores no grupo oficial do Facebook, criando e compartilhando ideias e aventuras", diz Christopher. O jogo também é usado de forma didática por cerca de 200 escolas no país.

"O preconceito era maior 10 anos atrás. A receptividade aqui foi melhorando, muita gente passou a trabalhar com temas brasileiros nos jogos, livros, temos mais aventuras e menos preconceito com o território brasileiro. Existe um interesse maior em grupos de discussão, podcasts e sites".

O cara do The Witcher brasileiro

O sucesso de A Bandeira fora do Brasil rendeu ao autor um apelido curioso: "Lá fora eles chamam a obra de 'Witcher brasileiro'. Me apresentam em eventos na Espanha como "o cara que faz o The Witcher brasileiro".

A comparação faz sentido: The Witcher nasceu como uma fantasia que explorava lendas e criaturas folclóricas do leste europeu, antes de se tornar uma importante franquia de games e, agora, uma série da Netflix.

Seguindo adiante com o projeto transmídia, A Bandeira do Elefante e da Arara vai ganhar um jogo digital, Três Reinos. "É uma ficção interativa, um RPG tático, com muitos finais diferentes e uma direção de arte única. E tudo se passa no mesmo universo e sistema do RPG de mesa". O game está em campanha de financiamento coletivo no Catarse.

Os produtos do RPG incluem A Bandeira do Elefante e da Arara: Edição Expandida, com todas as informações para jogar, o Manual dos Participantes, que é um guia para criação de personagens, e a Capitania Real do Rio de Janeiro, um guia completo para usar uma versão fantástica do Rio no seu jogo, além de três aventuras prontas.

A mais recente, chamada A Maldição de Ipaúna, foi escrita por um jogador de A Bandeira, Luciano Giehl, para um concurso realizado por Christopher para estimular aspirantes a escritores de RPG. O autor planeja realizar um novo concurso em 2020.

Além do concurso, A Bandeira do Elefante e da Arara vai receber no ano que vem sua primeira grande campanha, Flagelo no Amazonas, dividida "em cinco ou seis partes", revela Christopher. "É uma aventura épica, eu chamo de 'meu Dragonlance'".