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Review: DiRT 5

Simples, objetivo e divertido, jogo foge por pouco da repetitividade com experiência que cumpre bem seu papel, mas não aproveita grandes estrelas

Por Igor Nápol 06.11.2020 19H29

O rally é difícil... Aliás, difícil não: é MUITO difícil. A ideia de sair por aí acelerando entre árvores, casas, pessoas a mais de 200 e muitos quilômetros por hora é meio intragável para a maioria das pessoas, mas é pra isso que os videogames servem, certo? E a Codemasters, nesse aspecto, sabe bem o que faz – pelo menos na maior parte das vezes.

A série DiRT, que nasceu em 2007 pelas mãos daqueles que mais tarde viriam a trabalhar em um tal de Forza Horizon, veio justamente para trazer para o público casual a experiência de acelerar na lama e se divertir fazendo isso. O segundo jogo da franquia, DiRT 2, foi um verdadeiro formador de caráter para muitos jogadores e fãs do gênero de corrida.

Unindo uma jogabilidade simplificada (mas divertidíssima), uma trilha sonora maneira, um visual descoladão e um gameplay objetivo que cumpria muito bem seu papel, o game foi o primeiro em uma linha de sucessão que repetiu essa fórmula à exaustão até os simuladores voltarem para a cena quase 10 anos depois.

A Codemasters bem que tentou lançar com um jogo "Norvana", que unisse todas as tribos de casuais e hardcores, mas o que saiu foi uma aberração chamada DiRT 4. Na sequência, DiRT Rally 2.0 acertou em cheio no coração dos fãs de uma experiência mais visceral e voltada para a simulação, mas isso também significa que foi um título voltado para um público bem mais nichado.

Como aconteceu com GRID no ano passado e, de certa forma, com F1 2020, após o anúncio de que os direitos do WRC (campeonato mundial de rally) foram cedidos para a desenvolvedora – o que implica em mais jogos "sérios" no futuro –, a decisão foi de tentar uma nova guinada e tornar a série DiRT em uma referência de jogos de rally arcade que sejam amigáveis para o público mais casual e fundamentalmente divertidos de se jogar.

Codemasters/Divulgação

Sob o comando da Codemasters Cheshire (antiga Codemasters Evo), que é composta por funcionários da antiga Evolution Studios e que tem em seu currículo games como DriveClub, OnRush e MotorStorm, DiRT 5 chega com a promessa de resgatar sensações familiares para aqueles que jogaram DiRT 2, 3 e Showdown – e se apresentar também como uma alternativa para novos jogadores ingressarem na franquia.

Com uma escalação de peso para o modo carreira e carregando a bandeira de primeiro jogo de corrida a transitar entre as duas gerações atuais de consoles, é hora de descobrir como DiRT 5 se saiu.

Fazendo o básico muito bem

Se o objetivo era fazer um jogo de corrida offroad mais arcade, é possível dizer que DiRT 5 cumpre seu papel. Isso significa que os aspectos fundamentais do game, como visual, áudio e jogabilidade conversam muito bem entre si e, na maior parte do tempo, funcionam.

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Os gráficos do jogo, que foi desenvolvido em uma versão repaginada da engine usada em OnRush, são bonitos e, de forma geral, deu para perceber que a nova geração pode vir não na forma de gráficos ultrarrealistas, mas sim com cenários muito mais densos e populados. Um dos grandes destaques no visual de DiRT 5 é justamente a quantidade de elementos presentes nas mais variadas ambientações presentes no game.

Seja nas pedreiras da Itália, nas ruas entre as favelas do Rio de Janeiro, no meio dos vilarejos da Noruega ou nos percursos que passam pela ponte do Brooklyn em Nova York, uma constante é que o potencial dos novos consoles e dos PCs está sendo usado para fazer com que o ambiente ficasse mais denso e complexo, uma vez que a modelagem dos carros e os efeitos de partículas apresentam um nível satisfatório de detalhamento.

Codemasters/Divulgação

Além disso, as texturas dos cenários e os efeitos de iluminação também merecem destaque, especialmente em cenários como os pores-do-sol, tempestades, durante a aurora boreal – tudo ocorrendo de forma dinâmica ao longo da corrida – ou então correndo em percursos repletos de bastões de neon e refletores durante a noite. Ver uma tempestade de areia se formando ou o tempo fechando é algo muito bacana.

A performance do game é estável e não apresenta quedas de frames frequentes. Ainda assim, no pré-lançamento, o jogo apresentou algumas instabilidades tanto no PC quanto nos consoles e, durante o processo de análise, crashou algumas vezes. Nada, no entanto, que não possa ser corrigido mais tarde.

Já a parte de áudio mantém o nível de qualidade, com cada veículo soando de forma distinta, e os demais sons nos diferentes tipos de superfície – da torcida e tudo mais – complementando bem a ambientação. O destaque, no entanto, fica para a trilha sonora: Pearl Jam, The Prodigy, New Found Glory, Wolfmother e Foals são apenas algumas das bandas que fazem compõem a sensacional lista presente no game e que resgata um pouco daquele clima bacana de jogos mais arcade e de alguns de seus antecessores, como DiRT 2, 3 e Showdown.

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Um ponto que vale a pena ressaltar também é sobre as atuações de voz e a localização. A Codemasters mais uma vez fechou uma parceria com o estúdio brasileiro "Sound In Words", sob a direção de Wendel Bezerra, para trazer o jogo completamente dublado para português.

Falando um pouco da parte técnica antes de aprofundar na parte da narrativa, o trabalho feito na língua original por Troy Baker, Nolan North e que contou também com a participação de James Pumphrey e Nolan Sykes, da Donut Media, ficou muito bom. Salvo por alguns momentos mais "vergonha alheia", os diálogos soam naturais e atendem a proposta do podcast que serve como pano de fundo.

Na versão em português, a atuação de Wendel – que dubla Pumphrey –, é excelente, e seus companheiros também fazem um bom trabalho no papel de Nolan e Bruno Durand. No entanto, a atuação para AJ soa bastante forçada e acaba roubando um pouco da atenção durante o andamento do modo carreira – e não pelos melhores motivos.

Ainda assim, é um trabalho de localização bem feito, com diálogos que fluem bem e são cheios de personalidade, não sendo robóticos e seguindo perfeitamente um roteiro.

Codemasters/Divulgação

A jogabilidade de DiRT 5 é definitivamente uma das melhores partes do jogo – mesmo que com algumas ressalvas. Tendo uma característica bem arcade, os diversos veículos são relativamente fáceis de guiar, mas diferem entre si: os clássicos de rally de tração traseira tendem a ser um pouquinho mais melindrosos do que os ágeis carros de rallycross atuais.

As gigantescas picapes de rally conseguem passar bem seu peso, enquanto as gaiolas usadas na modalidade "rock climbing", movidas por motores imensos e muito potentes, tem uma tocada bastante peculiar. O mesmo acontece com os carros de sprint, que correm nos circuitos ovais na terra e que demandam uma certa familiaridade com o conceito de contra-esterço.

De forma geral, os controles são bem permissivos e isso garante que a jogatina acabe sendo mais focada em se divertir do que necessariamente domar o carro – algo comum nos jogos de rally –, mas sem perder totalmente a essência e se mantendo levemente desafiadora. Isso garante que o jogo seja bastante abrangente no que diz respeito ao público.

A observação fica na parte de que, mesmo com as assistências desligadas, o jogo ainda amarra um pouco dos inputs e jogadores mais experientes podem se incomodar um pouco com isso. Além disso, a jogabilidade em etapas na neve pode ser um pouco incômoda também.

Estrelas subaproveitadas e liberdade criativa

Falando sobre conteúdo, DiRT 5 acerta e erra quase na mesma proporção. O modo carreira, promovido como um dos grandes destaques e contando com nomes de peso, como Troy Baker e Nolan North citados anteriormente, gerou uma grande expectativa sobre possíveis novidades ou algo muito bem trabalhado.

O resultado final, no entanto, passa muito, mas MUITO longe disso: apesar de bem executado na parte técnica, o modo carreira é extremamente simples, e o que se tem são diversos eventos e diálogos entre os personagens, que tratam de contextualizar o que está acontecendo.

No entanto, não vai além disso. Seja AJ, personagem de Baker que serve como mentor ao longo da sua carreira, ou Bruno Durand, o antagonista da história interpretado por North, você não vê uma cutscene, ou até mesmo uma imagem que seja, que pudesse caracterizá-los. As atuações, embora contundentes, valem muito pouco ao não contar com qualquer suporte visual.

James Pumphrey e Nolan Sykes, rostos conhecidos pelos entusiastas da cultura automotiva graças ao canal Donut Media no YouTube, servem de hosts para o "Donut Podcast", que volta e meia toca entre os eventos para atualizar o jogador sobre o que acontece. É nele que você fica sabendo da história de Durand e sua rivalidade com AJ, ou que você escuta sobre os impactos de suas vitórias enquanto progride e trilha seu caminho em direção à glória de se tornar o maior vencedor do campeonato.

Mesmo que a narrativa rasa e clichê sirva para sua finalidade, que é ser um pano de fundo para dar algum propósito para o jogador correr tendo alguma sensação de propósito, a sensação é de que a presença de duas das maiores vozes da indústria de games foi imensamente subaproveitada.

Codemasters/Divulgação

A variedade de eventos é bastante satisfatória e a progressão é feita na forma de ligações, com cada um dos eventos completados liberando outros conectados a ele.

Você recebe "selos" dependendo do seu resultado (um para terceiro lugar, dois para segundo lugar e três para primeiro lugar), sendo necessário acumular um certo número para liberar os eventos finais de cada capítulo, o que poderá forçar o jogador a completar mais de um evento em cada coluna.

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Parece complicado, mas realmente não é: as corridas são curtas, indo de duas até cinco voltas em alguns casos. É entrar, escolher o evento, o carro e correr, sem grandes entraves e de uma forma bastante dinâmica, podendo chegar a ter 20 horas de gameplay para aqueles que buscam 100% dos eventos.

Com isso, DiRT 5 consegue se livrar de um problema que GRID 2019, por exemplo, não conseguiu: a repetitividade. Embora a maior parte das corridas consista em eventos com múltiplos carros em circuito ou em percursos de ponto-a-ponto (como é o caso dos Rally Raid, Stampede, Land Rush e Ultracross), há alguns eventos que trazem desafios que ajudam a dar uma oxigenada na experiência.

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São 64 veículos organizados em 13 categorias diferentes, com características bem distintas entre si e com alguns servindo para competições bem específicas. Os sprint cars, por exemplo, são usados apenas nos eventos de corrida oval na terra (Sprint), enquanto os rock bouncers são usados nas corridas de Path Finder, um desafio contra o tempo em terrenos bem acidentados e com subidas bem íngremes.

Outra coisa que ajuda bastante é a variedade de ambientes. As modalidades são divididas em 10 localidades diferentes, incluindo Brasil, África do Sul, Estados Unidos, Nepal, Noruega, Marrocos, Grécia, Itália e China, cada um contando com pelo menos duas variações de percursos. Os cenários diferem bastante entre si e isso ajuda bastante na sensação de que você está correndo em lugares bem diferentes a todo momento – o que, aliado à curta duração dos eventos, faz com que a experiência não fique tão massante.

Outros temperos que ajudam um pouco incluem a mecânica de patrocinadores, que garante bônus de créditos caso o jogador cumpra alguns desafios específicos, como terminar um corrida de ré ou fazer uma determinada quantidade de manobras. À medida que progride, você ganha níveis de reputação com os patrocinadores e isso desbloqueia pinturas para os veículos no game e outros itens de customização.

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Falando em customização, DiRT 5 dá a possibilidade de personalizar a pintura dos veículos que você vai usar. Embora não seja possível importar um padrão previamente criado, a função é bacana e te deixa escolher cores, texturas e padrões diferentes, além de permitir que você coloque adesivos de diversos patrocinadores no carro.

Como uma das modalidades mais divertidas e que faz seu reaparecimento depois de estrear em DiRT 3, a Gymkhana também traz a liberdade criativa na forma de um modo bem distinto: o Playgrounds. Nele, você tem a possibilidade de criar a sua própria arena com três atividades diferentes, entre Gate Crasher, que consiste em passar por uma série de checkpoints no menor tempo possível; Smash Attack, no qual você deve quebrar objetos específicos na arena também no menor tempo; ou a clássica Gymkhana, que te desafia a fazer diversas manobras para superar o objetivo de pontos.

Contando com uma mecânica similar às vistas em jogos como Trackmania, você deve criar o seu playground usando uma pletora de objetos diferentes, entre rampas, postos de zerinho, blocos, ônibus e muitos outros elementos. Depois de concluído, você pode disponibilizar sua arena para que outros jogadores tentem completá-la.

Embora não sustente o jogo por si só, o modo é interessante e promete dar um pouco mais de longevidade ao produto, conforme as mentes criativas dos usuários comecem a trabalhar e alimentar o modo com desafios diferentes, divertidos e cada vez mais complexos.

Codemasters/Divulgação

Um dos grandes problemas do modo carreira (e do jogo em geral) diz respeito à dificuldade. Enquanto o comportamento da IA seja bom na maior parte do tempo, mesmo na dificuldade mais alta ainda é possível passar pelos eventos com facilidade, mesmo com o jogo não escondendo o uso do artifício de "rubberbanding" – muito comum em jogos de corrida e que, via de regra, permitiria que os carros da IA consigam adequar seu ritmo com o do jogador e tornem a corrida um pouquinho mais desafiadora.

Ainda assim, há corridas em que o pico de dificuldade sobe consideravelmente, e isso pode ser um pouquinho frustrante, mas não é nada que arruíne a experiência.

Um resgate honesto ao período mais "divertido" da franquia

Se a ideia da Codemasters era trazer um jogo divertido que lembrasse a sensação de outros grandes títulos da franquia, como foi o caso com DiRT 2 e 3, pode-se dizer que DiRT 5 foi um grande acerto da desenvolvedora.

Apesar de ter exagerado um bocado quando promoveu a participação de Troy Baker e Nolan North como algo revolucionário e os dois acabarem apenas como duas vozes num enredo bem qualquer coisa, é inegável que, nos aspectos técnicos, o jogo cumpre bem o que promete: é um jogo de corridas offroad arcade bem divertido e gostoso de jogar, com belos visuais, bons sons, uma excelente trilha sonora e uma variedade muito boa de veículos e cenários para se aventurar.

Há um ou outro deslize, mas, no geral, o trabalho foi bem feito.

A chave para aproveitar a experiência é entender que não há nada de muito revolucionário no game, mas que ele é bastante competente em fazer o arroz com feijão. É uma experiência direta ao ponto, simples, mas pode divertir por várias horas – especialmente se você tiver criatividade e paciência para o modo Playgrounds.

Para um primeiro título do gênero de corrida para a geração atual e a próxima, dá para dizer que é um bom começo – não o melhor de todos, mas um começo honesto. O valor cobrado pelo game no PC é justo, mas para os usuários de console a sugestão é esperar um pouco – algo na ordem de 150 a 160 reais parece ser o limite para justificar o investimento.

No fim do dia, a Codie se recupera da aberração que foi DiRT 4 e entrega um game focado e fiel à sua proposta, sem tentar reinventar a roda.

Nota do crítico