CS:GO | Taco fala sobre a SK Gaming, o cenário brasileiro e mais

Entrevistamos o jogador brasileiro bicampeão do mundo de CS:GO

Por Guilherme Jacobs 30.08.2016 16H26

Pra um bicampeão do mundo, voltar pra casa pode ser tão bom quanto levantar os troféus. Epitácio "Taco" de Melo já ganhou dois mundiais de Counter-Strike: Global Offensive com o elenco brasileiro que defendia a Luminosity e agora está na SK Gaming. Quando o grupo joga, é com sangue nos olhos, quase sem piscar, em uma velocidade absurda.

Mas na manhã ensolarada em que sentamos para falar com ele no seu apartamento em Recife, cidade natal de Taco, ele não tinha uma gota de preocupação nos olhos. Isso mudou desde que a SK saiu das férias e voltou a treinar para os campeonatos que vem por aí no fim de 2016, mas um intervalo pra respirar e fugir da pressão sempre é bem vindo. 

Conversamos com Taco sobre essa pressão, a conexão do brasileiro com CS, o estado atual do cenário da modalidade aqui, e como é a vida na SK Gaming.

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Vocês ganharam dois mundiais e estão numa ótima fase. Como é voltar pra casa agora? 

É bom pra revigorar a alma, querendo ou não o tempo que passamos lá é longe da família e amigos, então dá uma acalmada, diminui a pressão, porque é muita pressão quando você tá no topo, a galera te cobra mais e estuda mais você também. Então dá uma revigorada. 

Não tem panqueca que supere cuscuz né.

Sem dúvida. Faz tempo que eu não comia cuscuz hahaha 

Eu acho interessante porque vocês estão subindo agora no cenário de CS:GO, num tempo em que eSports aqui no Brasil está ficando maior do que nunca, e eu acho curioso vocês no CS. É um jogo muito brasileiro. Você acha que a cultura brasileira ajuda os nossos jogadores? A gente tem uma facilidade de entrar no jogo? 

Eu acho que tudo se trata de escola. A escola do CS no Brasil é muito boa. No passado nós tivemos bons representantes. Tinha a época de lanhouse e o pessoal jogava muito. O Brasil era o país do futebol, por exemplo. Hoje tá mais ou menos. Mas por que? Porque no passado teve uma escola muito boa. Garrincha, Pelé, etc. E a geração vai passando e a escola sempre vai melhorando.

Então eu acho que é questão de escola. É muito importante termos uma escola boa de CS, da época em que lanhouse era uma febre, galera jogava direto, mesmo que fosse outra versão. A escola do Brasil sempre foi muito boa, mesmo passando por altos e baixos.

Eu noto essa conexão do brasileiro com CS quando vocês tão jogando. Parece que é a seleção brasileira entrando em campo. Vocês estão na SK agora, que é da Alemanha, mas o pessoal vê vocês como os representantes do país lá fora. Vocês sentem pressão, sentem o apoio da galera?

É um absurdo. A gente representa a SK, nossa organização, mas a gente tá lá jogando pelo Brasil também. Nós sentimos isso. É um apoio absurdo, que é muito bom quando você tá bem, e um apoio ruim quando você tá mal. O brasileiro tem muito disso. Lá fora, nos outros países, quando um time vai bem, o apoio não é tão grande, mas a galera pega mais leve quando eles vão mal. 

Ajuda, ter essa cobrança a mais?

Depende. Depende da cabeça da pessoa. No começo isso me atrapalhou muito. Eu entrei no time muito novo, sem experiência internacional. Com três dias de time, já estava jogando num mundial na Suécia. No começo todo mundo criticava muito. “O que esse cara tá fazendo no time? Meu Deus, muito ruim.” Então, me atrapalhou demais, porque além de ser novo, tanto em idade quanto no cenário, foi horrível. A galera mais velha entrou aí, me ensinando e dizendo pra não dar ouvido. No geral eu acho que não ajuda muito. 

Mas hoje então você não vê isso te atrapalhando mais?

Hoje mais não. Pra jogadores que estão começando isso é muito ruim. Ninguém gosta de ser criticado mas hoje faz menos diferença do que antes.

Entendi. E como tem sido essa loucura de sair do Brasil, ir pro Luminosity, ganhou campeonato lá, e agora tá no SK. Esse crescimento rápido, pessoalmente, como tem sido pra você?

Não caiu a ficha ainda. Eu sempre soube o que é a SK. Sempre foi uma organização monstruosa, e agora eu tô defendendo ela. Eu vou completar um ano nos Estados Unidos agora. Passei cinco meses na Games Academy, que agora tá começando expandir, mas do nada veio um boom. Em seis meses a gente ganhou dois mundiais. Eu acho que ainda não caiu a ficha, mas é um sonho realizado.

Quando a gente vê vocês jogando, tem uma pegada diferente dos outros times. Por exemplo, vocês colocando duas AWPs aqui e ali, e a gente fica “o que eles tão fazendo?” Mas aí funciona, dá tudo certo. O jogo de vocês é mais solto e leve. Vocês parecem estar se divertindo. Como é o equilíbrio entre a estratégia e essa leveza?

Acho que é tudo química. Nosso time tem muita química, tanto dentro do jogo quanto fora, o que ajuda bastante. Mas a parte no jogo é exatamente isso. Nós não temos muita estratégia robotizada, ficamos mais livres, mas ao mesmo tempo respeitamos nosso padrão de jogo. 

Treinamos muito. Isso ajuda a pegar entrosamento. Hoje eu sei o que os quatro do meu time estão fazendo sem eles precisarem falar nada, mesmo com esse estilo mais livre. Nós também temos uma comunicação boa. Sempre tentamos melhorar muito ela. A gente tem um estilo livre mas eu acho que é a química. 

E por que você acha que vocês encontraram essa química especial?

Eu acho que a gente tem cinco jogadores que fazem as cinco funções do jogo melhor que todos no Brasil. Quando montamos esse elenco foi com esse intuito. Na LG, sem mim e sem o Fenix, eles não tinham um jogador que fazia um “lurk” tão bom quanto o Fenix, e não tinham um jogador que era um “entry fragger,” que é o que eu faço agora. Então todo mundo entende sua função bem e faz muito bem a função. Eu acho que os cinco que estão hoje são os melhores do Brasil nas cinco funções. 

A ESL anunciou que as finais da Pro League vão ser aqui no Brasil, em São Paulo. Você acha que vocês contribuíram para trazer isso pra cá? 

Sem dúvidas. Acho que a razão pela qual estão trazendo isso pra cá é porque nós mostramos pro mundo que o mercado brasileiro tem muito hype com CS:GO

E como isso deixa vocês? Sentem uma responsabilidade?

Tem responsabilidade sim, mas sinto mais animação do que pressão. Eu estou ansiosíssimo para chegar na arena em São Paulo - se conseguirmos a classificação, e eu acho que conseguiremos - com a torcida brasileira e ver o que vai acontecer.

Seria uma final dos sonhos pegar outro time brasileiro na final?

Eu acho que o Immortals pode se classificar junto conosco também. Seria o cenário ideal. Ir pra final com outro brasileiro, e ganhando a final, claro.

Tem sido bom esse tempo de vocês na SK?

Acho que sim. Tem sido maravilhoso. Ajudou muito, a troca de organização, para aumentar a autoestima, a confiança. Podia ter tido um efeito muito ruim, mas foi muito bom.

O próximo campeonato presencial de vocês é a ESL One Nova York. Qual será o principal desafio de vocês lá, depois de vencer em Colônia? 

Falam que chegar no topo não é tão difícil quanto ficar lá, e a gente tá sentindo isso agora. Todos os times estão de olho na gente, querendo nos tirar de lá. 

Vocês viraram aquele time que, se forem eliminados, todo mundo vai falar “agora nós podemos ganhar.”

Isso. Todo mundo quer eliminar a gente. Eles estão com sangue nos olhos. A gente conversa com outros jogadores e eles dizem que nos assistem jogar pra aprender o que fazemos. Acho que o maior desafio - nós teremos apenas uma semana e meia com o Fer quando ele voltar da cirurgia - então o maior desafio é usar esse curto tempo para criar coisas novas.

Finalmente, como você avalia o cenário brasileiro atualmente? O nível está aumentando? Tá bom?

Eu comecei a jogar CS:GO numa época horrível. Não existia organização, mídia, nada. Era cada um por si. Cada um criava sua tag e jogavam campeonatos criados pelos jogadores. Comparando com isso, hoje tá uma maravilha. Vemos organizações grandes como paiN, INTZ, CNB, Keyd, entrando e apoiando o CS:GO. Mas ainda não é o ideal. Quando comparamos com a situação lá fora…

Ainda não está perto do mesmo nível. 

É, o Brasil está meio ridículo. Eu não quero soar grosso, mas é essa a expressão. 

E como a gente pode melhorar? O que falta pra chegar no nível que vocês têm lá fora? 

Investimento em primeiro lugar. Profissionalismo - eu acho errado que as organizações cobrem profissionalismo dos jogadores e não agem como profissionais. Eles dão pouquíssimas condições pro jogadores, pelo menos no CS:GO. O salário, as condições, é ridícula. A troca de favores é desproporcional. Os contratos são apelativos. 

Falta muito investimento, de patrocinadores, de empresas grandes - como a ESL que chegou e já tá organizando coisa aqui - seria bom se elas viessem pra cá. Aí entra um pouco de política. O país está passando por uma situação difícil e isso não atrai as empresas pra virem pra cá. 

 Então em primeiro lugar investimento. Em segundo lugar profissionalismo, de ambos os lados. Tanto das organizações quanto dos jogadores. 

E por fim. Você tá animado? Pro futuro do CS:GO, da SK Gaming, de tudo mais?

Tô animado sim. A gente trocou de casa agora nos Estados Unidos.

Agora cada um tem um quarto? 

Agora cada tem um quarto! Um quarto pra cada um! Isso dá uma animada. A gente tem as melhores condições de treino. Uma casa grande - na outra casa eu não podia nem virar o mouse pra direita que batia na parede - então temos as melhores condições. Estamos recebendo o que achamos justo, estamos bem no campeonato. Tô animado pra continuar treinando e jogando. 

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