Depois da briga entre uma mãe e os livros de Joanne Rowling, a cidade de Atlanta entrou em mais uma discussão envolvendo livros. A origem do debate foi a decisão do Gwinnett County Public Library Board, entidade responsável pela administração das bibliotecas públicas do condado, de cortar o orçamento para a compra de livros em língua espanhola. Ao todo, as treze bibliotecas públicas locais têm apenas 798 livros de ficção adulta em língua espanhola para uma população de mais de 105 mil latinos. A verba para aumento na quantidade de títulos era de três mil dólares anuais.

Para o presidente do Public Library Board, Lloyd Breck, a decisão foi simples. Ele declarou que não havia verba suficiente para todos os idiomas falados pela comunidade local, assim, para não favorecer a nenhum grupo, a verba para livros em outros idiomas foi cortada. Outro membro do comitê, no entanto, discorda da decisão e da motivação. Brett Taylor comentou que o corte foi motivado pela decisão de que não é necessário comprar livros em espanhol para atender a uma população que precisa ser encorajada a falar inglês.

Gwinnett tem a maior população latina do estado da Geórgia e a imigração ilegal tem crescido ano a ano, gerando preocupação. Descontente com a compra de livros em espanhol, um morador do condado escreveu ao comitê de bibliotecas para dizer que o "a maneira americana" é aprender inglês para assimilar a cultura do país, e não facilitar as coisas para quem não é fluente no idioma, completando que esperava que seus impostos não fossem mais usados para a compra de livros desse tipo. Ações similares aconteceram em outros pontos do país. No verão passado, um grupo exigiu a renúncia do bibliotecário da biblioteca pública de Denver sob a alegação de que o local prestava serviços a imigrantes ilegais às custas dos impostos dos moradores. No Colorado o republicano David Schultheis tentou proibir as bibliotecas públicas de comprar quaisquer materiais em outro idioma além do inglês, com exceção de livros didáticos.

A decisão em Gwinnett foi considerada um gesto político e rude para com os hispânicos em um editorial no jornal Atlanta Journal-Constitution. O diretor executivo da Georgia Association of Latino Elected Officials, Jerry Gonzalez, disse que o condado tem uma comunidade latina que paga impostos e tem de ser atendida pelas bibliotecas públicas.

Por outro lado, há uma constante preocupação com a falta de proficiência no uso da língua inglesa por grande parte dos imigrantes latinos. É comum encontrar nas ruas de Los Angeles hispânicos que não falam inglês mesmo após vários anos de residência nos Estados Unidos, o que é ruim para a própria comunidade, já que é nesse idioma que as leis, as universidades e os melhores empregos estão disponíveis no país. K.C.McAlpin, diretor executivo do ProEnglish, um grupo de defesa da língua inglesa diz que os imigrantes não devem esperar que o acesso seja facilitado em seu idioma nativo. Nos anos 90 um aluno da UCLA questionou no jornal da Universidade o acerto da disponibilidade de tirar carteira de motorista com exames em espanhol, uma vez que seria necessário saber inglês para entender a sinalização e, principalmente, as orientações de um policial em caso de acidente ou infração.

Para os bibliotecários estadunidenses a decisão no condado de Gwinnett estabelece um perigoso precedente. O bibliotecário da UCLA, Gary E. Strong, diz que a função da biblioteca pública é servir a todos na comunidade, sejam imigrantes legais ou ilegais, falantes de inglês ou não. A biblioteca pública de Los Angeles possui títulos em espanhol desde sua fundação, em 1872, além de oferecer livros em pelo menos 50 idiomas árabes, asiáticos, europeus, escandinavos e eslavos. Para os bibliotecários, a oferta de livros em língua estrangeira tem o efeito oposto ao imaginado pelos críticos. Leslie Burger, presidente da National Library Association, diz que os livros integram os imigrantes à comunidade, encoraja-os a aprender inglês e diminui o analfabetismo.

A decisão de Gwinnet transformou-se rapidamente em discussão nacional nos últimos dias, forçando o Public Library Board a voltar atrás em sua decisão, restaurando a verba para a compra de livros em espanhol. Entre as cartas e mensagens recebidas pelos responsáveis, no entanto, metade apoiou a decisão, o que mostra que a discussão está longe de encerrada.