Grim Fandango, Full Throttle e Day of the Tentacle. Essa pequena lista pode estar na carreira gamer de muitos dos nossos leitores — especialmente se ele for um jogador de PC de longa data. E, lá no fundo, todos esses games têm um ponto em comum: Tim Schafer, o fundador da Double Fine conhecido pelo seu tom cômico na hora de construir narrativas dentro dos jogos eletrônicos.

Foi justamente com essa grande personalidade que tivemos a oportunidade de conversar durante a Geek & Game Rio Festival, que aconteceu entre os dias 21 a 24 de abril no Rio de Janeiro. Entre entrevistas, fãs e palestras, o simpático game designer americano trocou algumas palavras com o Omelete sobre design de jogos, crowdfunding, viagens no tempo e o seu trabalho mais recente, Psychonauts 2.

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Muitos consideram os seus jogos atemporais. Você vê, como um game designer, alguma diferença entre as pessoas que jogaram os seus jogos há muito tempo atrás e as pessoas que jogam hoje?

Bem, algumas coisas mudaram e outras coisas não. Antes, você tinha um jogo a cada três meses. Você literalmente passava o verão inteiro trabalhando em um jogo de aventura. Você também não tinha a internet para dar uma olhada nas respostas ou procurar em um guia para o jogo, então era forçado a descobrir tudo por si mesmo. Hoje em dia, se você tem um quebra-cabeça difícil, as pessoas tendem a olhar por isso ou deixar o jogo e nunca mais encostar nele.

Então é difícil de se manter com os velhos quebra-cabeças nos jogos de aventura, e é o que algumas pessoas querem fazer. Eu acho que estamos aqui para elas, para criar jogos de aventura e trazer muitas surpresas.

O que você considera mais importante na hora de trazer os jogos para a atual geração de consoles?

Eu sempre foquei nas histórias e nos personagens, já que algumas coisas são atemporais e envelhecem muito bem. Em Full Throttle houve algumas coisas técnicas que conseguimos melhorar, pois a tecnologia mudou muito e evoluiu ao longo dos anos, e então podemos criar coisas que queríamos na época só que ainda mais bonitas. E também tem o som que não é comprimido e pode ser encaixado muito bem.

Creio que os gamers querem ver artes que não "destruam seus olhos" e um som que seja muito bom, mas as pessoas continuam gostando dos jogos pelas mesmas razões. Elas querem teleportar para um mundo de fantasia que pareça real, onde os personagens são interessantes, onde eventos incríveis aconteçam e quebra-cabeças te desafiem.

Se você pudesse escolher qualquer um dos seus jogos para mandar pra um gamer daqui 200 anos, qual game você escolheria?

Haha! Bem, vamos ver... Só em dois anos podem acontecer várias coisas na história americana, como até uma troca na constituição. Algo que provavelmente eles precisem fazer. (hehehe)

Mas, além disso, é uma pergunta difícil. Como o mundo será daqui 200 anos? Obviamente nós vamos viver debaixo da terra, nos escondendo de radição ou algo assim. Então há muitos jogos possíveis. Um jogo difícil e de longa duração, como Grim Fandango, pode ser o melhor.

Você já teve alguma ideia que não funcionaria em um jogo?

Nós já tivemos várias ideias que, se fizessemos um retrospecto e soubéssemos como seria no fim, talvez nunca acharíamos que seriam possíveis, sabe? Fazer um jogo sobre a cultura mexicana ou mesmo um game em que todos os personagens estão mortos parece ser realmente difícil de fazer, mas eu acho que os games podem fazer qualquer coisa. Acho que é uma mídia que é muito flexível e você pode explorar qualquer tópico.

Eu sinto que qualquer coisa é possível nos jogos. Algumas vezes toma muito tempo, muito dinheiro e precisa de muitas pessoas inteligentes, mas com essa combinação você pode fazer qualquer coisa.

Vocês também foram um dos pioneiros a explorar o financiamento coletivo. Como você vê isso para quem quer tornar os seus jogos uma realidade?

A revolução do financiamento coletivo mudou muita coisa, basicamente colocando mais poder nas mãos das pessoas. Lá atrás nós tínhamos um pouco do que chamamos de "dono da chave", quando uma companhia decide onde investir o dinheiro e como fazer isso. E isso estabeleceu algumas coisas ao longo dos anos, como "ninguém mais quer jogos espaciais" ou "ninguém mais quer comédias", e eles não investiriam nessas coisas porque as suas pesquisas diziam para não apostar mais nisso.

Mas o financiamento coletivo permite que as pessoas falem "nós queremos isso", "nós queremos o seu jogo de aventura". Talvez não sejam muitas, mas elas são suficientes para pagar por isso. Então o sistema organiza e permite viabilizar uma arte que não seria possível sem elas.

Há uma grande diferença em como os games são feitos hoje para como eles eram feitos antigamente. Você vê algo em especial entre essas duas "eras"?

A maior diferença é que o processo é mais transparente, o que eu acho que é algo positivo. Nós fazemos documentários de como fazemos os jogos. Há muito mais interação com a comunidade agora. Você faz os jogos e as pessoas sabem do seu jogo muito tempo antes dele ser lançado. Elas comentam sobre o seu game, e isso pode ser muito cansativo por conta dos comentários negativos. Mas ainda assim é bom para as pessoas verem mais como os jogos são feitos.

Além disso, tudo isso permite que os jogos sejam focados aos jogadores. Mais ligado com as reações das pessoas, permitindo mais testes. E é o que estamos fazendo muito agora.

Você está trabalhando atualmente em Psychonauts 2. O que está te deixando mais empolgado com esse jogo?

É incrível trazer o jogo de volta e também todos os atores originais. Todos os que fizeram o primeiro jogo estão de volta e colocar eles de novo é sensacional porque eles realmente amam os seus personagens. Eu adoro pensar o que eles pensam ao voltar nesses personagens.

Eu amo o tom e a sensação de Psychonauts. É divertido ser um explorador no mundo mental das pessoas, e isso sempre foi um tópico favorito para mim. Voltar nesse game design é realmente incrível.

Gostaria de dar alguma mensagem para os gamers brasileiros que acompanham os seus jogos?

Muito obrigado por jogar! Estou muito empolgado por estar aqui no Brasil porque nunca vim para cá. Estou interessado em conhecer alguns dos desenvolvedores e da comunidade de gamers.

E também muito obrigado por trazer a versão em português do nossos jogos naquele tempo. Sou muito grato por fazer estes jogos e as pessoas jogarem eles. Muito obrigado!