Quando, em janeiro de 2018, Olga Rodrigues entrou para a Bootkamp Gaming e se tornou a primeira mulher trans no competitivo de CS:GO brasileiro, ela sabia que o caminho seria árduo.

Na época, em entrevista ao site Versus, Olga disse que a aceitação do seu gênero pelo cenário seria complicada. “Duvido que deixariam que eu jogasse em um time”, comentou na época. “Na verdade, eles tem que deixar, mas eu vejo muitas pessoas que ainda não aceitam isso.”

Como jogadora, antes de se identificar como mulher trans, Olga passou por Dai Dai, SLK Gaming, SiteCs e Remo Brave, vencendo a Liga Pro da GC e, em seguida, a Brasil Game Cup 2016. A confiança com o cenário e os problemas familiares por conta de sua sexualidade afastaram Olga do competitivo como jogadora na época.

A transição foi uma jornada de autoconhecimento e aceitação. A jogadora, inclusive, vendeu peças de seu computador para conseguir o seu tratamento hormonal. Após organizar sua vida, ela marchou rumo à volta no cenário.

Olga enquanto jogadora da Bootkamp Gaming

Foto: @mindlesslyx/Reprodução

Mais de dois anos depois, Olga batalhou como técnica e jogadora pela Bootkamp até chegar à Black Dragons como jogadora. Na BD, Olga mora em uma gaming house, um dos sonhos de sua vida, e pela primeira vez consegue se sustentar apenas com esports, sem precisar de trabalhos secundários para compor renda.

“Jogo no time feminino da Black Dragons com a Dinha, Marii, Anabala e Yungher, e disputamos o CBCS, campeonato que tem equipes conhecidas do cenário e até jogadores que disputaram Major”, como é o caso de boltz e felps, ex-MIBRs.

Apesar de estar vivendo o seu sonho, Olga já passou por situações de transfobia no cenário. “Sei que diversas equipes não me aceitariam por ser uma mulher trans”, afirma. “Muitas organizações do cenário tem o poder de amparar e apoiar pessoas da comunidade LGBT, mas poucas realmente querem fazer isso”. Segundo a jogadora, é um reflexo da dificuldade que alguém fora do padrão encontra para se sentir incluída na comunidade, e consequentemente em campeonatos e equipes profissionais.

Em 2018, o elenco que representava a Vivo Keyd entrou em polêmica ao vencer uma partida contra a Bootkamp, equipe de Olga, e mesmo assim postar comentários transfóbicos, ao citar uma possível irregularidade na inscrição de Olga por ser uma mulher trans jogando um campeonato feminino. O elenco foi dispensado pela organização após revolta do cenário com a situação, e os tweets das jogadoras e do técnico Guilherme Walck foram posteriormente apagados.

Olga (primeira da esquerda) com o elenco da Black Dragons Female.

Foto: Divulgação Black Dragons

É uma vivência que acontece rotineiramente com pessoas de todas as modalidades do esporte. Caso, por exemplo, da jogadora profissional de voleibol Tiffany, uma mulher trans que convive diariamente com recusas de outras jogadoras e equipes por disputar a Superliga Nacional Feminina.

Tiffany, jogadora trans de voleibol do Vôlei Bauru

Foto: Associated Press

Para Olga, muitas pessoas da comunidade LGBT ficam com receio de assumirem sua identidade de gênero e orientação sexual por potencialmente passarem por consequências profissionais e entre a comunidade dos esportes e esports.

Por toda a dificuldade, Olga é grata por todas as equipes que a acolheram, principalmente a Black Dragons, casa da jogadora desde a metade de 2019 e a primeira que lhe deu a oportunidade de morar em uma gaming house e viver do CS:GO. “Tenho muito a agradecer à BD pela oportunidade, e na verdade a todas as equipes por onde passei”, diz Olga. “Sei quanto hate as organizações podem receber ao me ter na equipe, e é muito importante saber que diversas pessoas e jogadoras me dão a oportunidade de continuar seguindo o meu sonho”.

Para pessoas fora da comunidade LGBT, Olga dá uma dica importante para ajudar e transformar o meio de esports em um ambiente mais receptivo para todos: “Exponha e não passe pano para quem é LGBTQIA+fóbico (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Trans, Queer, Intersexo, Assexuais, Pans e demais). Acolha pessoas dessa minoria e sempre que puder deem visibilidade e apoio a elas.”

“Nossas vozes são importantes, e é muito bom quando as pessoas dão ouvidos a nós”, finaliza a jogadora.

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Imagem: Globo